Fim
da reeleição, implantação do parlamentarismo, penas mais duras para crimes
contra a vida e limites para doações eleitorais. Apesar de estar deixando a
política, o senador José Sarney (PMDB-AP) não se furtou de opinar sobre vários
assuntos, ao fazer seu último discurso no Plenário do Senado, nesta
quinta-feira (18). Sarney lembrou realizações de seus mandatos, fez várias
sugestões para a vida política e social do país e recebeu homenagens de colegas
senadores. Para Sarney, é preciso criar cláusulas de barreira para os partidos.
Segundo o senador, é importante evitar a proliferação de legendas que “só
servem para negociações”. Ele afirmou que 80% dos partidos são dirigidos por
comissões provisórias – que não representariam nem o partido nem a sociedade.
Acrescentou que os partidos precisam valorizar a democracia, realizando
eleições internas. Sarney defendeu o voto distrital misto e o fim da reeleição,
com mandatos de cinco ou seis anos para o Executivo. Ele pediu o fim das
medidas provisórias e uma solução definitiva para o financiamento de campanha –
com um valor limite de referência para as doações. Apesar de ter voltado à
política após deixar a presidência da República, Sarney disse acreditar que os
presidentes deveriam ser proibidos de exercer qualquer cargo público, mesmo que
eletivos, após finalizarem o mandato. Ele registrou que se arrependeu de ter
voltado à vida pública e disse que um ex-presidente deve ficar acima dos
conflitos e se dedicar a unificar o país. Sarney também pediu a implantação do
parlamentarismo no país, como “um dispositivo contra as crises” e defendeu
penas mais graves para crimes contra a vida.
—
A vida é o bem maior que Deus nos deu e o homicídio ainda não é crime hediondo
— criticou, pedindo também mais investimentos no combate às drogas.
Para
o senador, a educação precisa passar por uma reformulação dos currículos, com
incentivo à formação e capacitação de professores e mais investimentos em
tecnologia e inovação. Sarney também prometeu reapresentar um projeto de
Estatuto das Estatais, como forma de proteger o patrimônio público contra
escândalos como os que estão ocorrendo com a Petrobras. Sarney ainda defendeu
um projeto de sua autoria, que está parado na Câmara e regulamenta o artigo 245
da Constituição, que cria o fundo nacional de assistência às vítimas (PL
3.503/2004). Ele lembrou que existe o auxílio-reclusão, mas os que são vítimas
“não têm direito a nada” e alguns “têm direito só à eternidade”. Ele admitiu
que ainda “tem apreensões” e criticou o ódio que vem se apresentando na sociedade,
após as últimas eleições.
—
É hora de conciliar o país. Tenho visto algumas manifestações exacerbadas aqui
no Congresso. A política é democrática. Passadas as eleições, o país deve
buscar um terreno comum, o bem público — declarou o senador, dizendo que o
Brasil precisa de mais sonhos e utopias.
Trajetória
Aos
84 anos, Sarney deixa a política depois de três mandatos de senador pelo Amapá.
No discurso, ele relembrou sua trajetória de homem público, desde quando era
deputado federal, na década de 1950, até chegar aos vários mandatos no Senado,
passando pelo governo do Maranhão e pela Presidência da República. Sarney
lembrou que tem 60 anos de vida pública – o que o torna o parlamentar mais longevo
da história do país. Ele agradeceu a confiança do povo do Amapá e do Maranhão,
o que lhe permitiu vários mandatos, e a todos os demais brasileiros, pela
oportunidade de presidir o país. Segundo Sarney, o Maranhão é o 16º estado do
país em produto interno bruto (PIB), com crescimento econômico anual de 10,3%,
índice comparável ao da China. Esses números, registrou o senador, são bem
diferentes dos que encontrou em 1966, quando assumiu o governo do estado. Já no
Amapá, iniciativas de Sarney levaram um hospital da Rede Sarah e uma
universidade federal ao estado, que também conta com uma zona de livre comércio
consolidada, duas hidrelétricas em construção e uma em funcionamento, além do
Linhão de Tucuruí, empreendimento que também vai levar a fibra ótica ao estado.
Segundo o senador, esses fatos mostram que a situação atual é muito melhor do
que a encontrada há alguns anos. Como presidente da República, Sarney lembrou
que foi o autor do projeto que assegurou às pessoas com aids o recebimento
gratuito de medicamentos e da proposta de cotas para negros. O senador destacou
iniciativas no setor cultural, como a Lei de Incentivo à Cultura, que já é uma
realidade, e a Política Nacional do Livro, que está em análise na Câmara dos
Deputados. Ele apontou a cultura como sua principal causa legislativa e disse
que passava “essa bandeira” à senadora Marta Suplicy (PT-SP), que foi ministra
da Cultura. Sarney reconheceu as dificuldades da vida pública, mas disse que
fez muitos amigos na política.
—
Deus me poupou do ódio, da inveja e do sentimento de vingança — afirmou.
Futuro
Sarney
afirmou não temer pelo futuro político da família e lamentou a falta de grandes
lideranças nacionais. Ele disse que não “tem mais futuro e só tem passado”.
Prometeu reler seus livros e disse que, na sua idade, o gosto da releitura se
torna melhor do que o da leitura inicial. Sarney ainda admitiu que,
“infelizmente”, a política o levou para caminhos distantes da literatura.
—
Deixo no Senado uma palavra: gratidão. Saio feliz, sem nenhum ressentimento.
Ai, meu Senado, tenho saudades do futuro — concluiu.
Agência Senado
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