segunda-feira, 5 de julho de 2010

Abolição em construção

Políticas afirmativas iniciadas por Sarney já têm resultados importantes no governo Lula

Em sete anos, mais jovens negros entraram nas universidades do que nos últimos vinte anos

O governo Lula implantou o sistema de cotas para negros e pardos nas universidades federais brasileiras em 2004, na Universidade de Brasília (UnB). Na época, menos de 2% do percentual de estudantes universitários brasileiros eram negros, apesar de representarem mais de 46% da população brasileira. Hoje, já são quase um milhão de estudantes negros em cursos superiores e 17 universidades federais mantém sistema de acesso por meio de cotas. Pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) indica que, durante os últimos sete anos, mais jovens negros ingressaram em universidades públicas do que nos vinte anos anteriores. Para o militante do movimento negro, Paulo Ramos, “as oportunidades para a juventude negra foram ampliadas durante o governo Lula em função das políticas sociais”. Em encontro com negros e negras do PT, em Brasília, a candidata do PT, Dilma Rousseff, defendeu a manutenção das políticas afirmativas e de cotas. Segundo ela, nos últimos anos o governo teve grandes avanços nesse campo, mas é preciso fazer mais. “O que nos une é o compromisso de que vamos continuar fazendo políticas afirmativas e de cotas, queiram eles ou não queiram”, afirmou Dilma.

Cotas no ProUni

Só no ano passado, com a política de cotas e com o Programa Universidade para Todos (ProUni), aumentou em quase 50 mil o número de alunos negros nas universidades brasileiras. No primeiro semestre de 2009, houve um acréscimo de 5% no número de estudantes negros nas instituições de ensino superior. Em sua primeira edição, no ano de 2004, o ProUni foi o principal responsável pela inserção maciça dos afrodescendentes, ao oferecer 46 mil bolsas de estudo para o sistema de cotas, o que significou 41,5% das 112 mil vagas disponibilizadas pelo programa. O ex-diretor do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Carlos Henrique Araújo, defende o sistema de cotas, tanto nas universidades públicas, quanto nas universidades privadas, por meio de isenção fiscal. “O fenômeno de exclusão educacional atinge de maneira muito mais forte o aluno negro. A peneira é fechada para todos e muito mais fechada e seletiva para os alunos negros", revela o diretor.

Depois da universidade

Os estudantes que entraram na universidade por ação afirmativa têm direito, desde 2009, a 600 bolsas oferecidas pelo Programa Institucional de Iniciação Científica (Pibic), no valor de R$ 360 por mês, pagos durante um ano. Em maio, esse número foi ampliado para 800 bolsas. Além disso, 250 alunos oriundos do ProUni e de outras ações afirmativas serão beneficiados pelo programa para concessão de bolsas de mestrado e doutorado para apoiar a produção científica de estudantes negros. O programa foi criado este ano e as bolsas serão distribuídas neste semestre.

A criação da Fundação Cultural Palmares por Sarney, em 1988, foi marco no resgate da histórica dívida brasileira com os negros

Não raramente, por trás de vários projetos em favor das causas dos negros brasileiros já transformados em leis, estiveram os esforços do maranhense José Sarney, tanto como presidente da República, quanto como deputado ou senador. Ainda jovem, aos 31 anos, o deputado Sarney, como delegado especial do Brasil na XVI Assembléia Geral das Organizações das Nações Unidas (ONU), subiu à tribuna para condenar o apartheid. A criação da Fundação Palmares, em 1988, pelo então presidente da República, José Sarney, é marco no resgate da dívida histórica com os negros no Brasil. Novamente na ONU, mais de duas décadas depois e como presidente da República, José Sarney assinou a adesão brasileira ao tratado contra qualquer forma de discriminação. No trabalho constante em favor da causa dos negros, já fizera decreto presidencial transformando em monumento nacional a Serra da Barriga de União dos Palmares, em Alagoas, onde foram travadas as lutas li­deradas por Zumbi, ícone da luta por liberdade dos negros escravos brasileiros.

José Sarney recebendo, em 2003, a visita do presidente da Fundação Palmares, Ubiratan Araújo, que levava convite especial para as comemorações dos 15 anos da entidade que o ex-presidente fundou.

Luta constante

A Fundação Palmares homenageia a luta por igualdade de direitos e oportunidades, fortalece o movimento negro e abre portas para novas e fundamentais ações afirmativas em defesa da causa. Projetada em parceria com o seu Ministro da Cultura, Celso Furtado, como instituição que congregasse e estimulasse apoio à causa e às lideranças do movimento negro brasileiro, a instituição nasceu em agosto de 88 nas comemorações do Centenário da Abolição da Escravatura. Sarney, então, pregou contra a indignidade da segregação racial, acentuando que, “desprovida de qualquer fundamento científico, religioso ou moral, se baseia apenas no egoísmo de grupos racistas, tendo como objetivo a escravi­dão econômica e a manutenção de um sistema de privilé­gios, sem nenhuma consideração pelos direitos fundamen­tais do ser humano e pelas aspirações de liberdade...”. Antes, na justificativa do projeto de criação da entidade, o presidente Sarney havia comparado a exclusão da comunidade negra com a dos pobres, para defender que ambas devem ser combatidas. “Mas, mesmo superpostas, elas não podem ser confundidas. Os negros, entre os pobres, são os mais pobres; entre os que não conseguem o acesso à educação, a maioria, entre os doentes, os mais graves”, lastimou. Em discurso sobre o Centenário da Abolição o presidente Sarney também distinguiu e homenageou as muitas nações de africanos que compuseram a matriz do povo brasileiro. “Evoco nossas avós e mães cabindas, minas, jejes, na­gôs e iorubás, que velejaram de Angola, da Nigéria, do Be­nim, de Cabo Verde, de Guiné, de Moçambique, São To­mé, de toda a África, para se juntarem e formarem o povo brasileiro. Sofrido povo, grande povo, ajudando-o na construção de um grande País. O Brasil brasileiro, Brasil africano, que libertou a raça negra para dela ficar escravo para sempre sangue do seu sangue. Neste dia, louvores à raça negra do Brasil”.

Ações afirmativas

A Fundação Palmares foi e continua sendo o primeiro e mais importante órgão do governo federal para as questões raciais brasileiras, com especial atenção à cultura e ao patrimônio afro-brasileiro. Tal tarefa pressupõe várias iniciativas – entre elas, o reconhecimento das terras quilombolas e o Programa de Ação Afirmativa Bolsas-Prêmio de Vocação para a Diplomacia para Afro descendentes do Instituto Rio Branco. Sempre empenhado nas demandas dos negros ainda não atendidas, em 1999, Sarney também apresentou projeto de lei instituindo cota mínima de 20% para a população negra no preenchimento de vagas nos concursos a cargos públicos, nas instituições de ensino nos três níveis de governo - federal, estadual e municipal - e nos contratos do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies). O projeto foi aprovado no Senado e depois incorporado na Câmara à proposta do Estatuto da Igualdade Racial, apresentado pelo então deputado Paulo Paim (PT-RS), e que ainda está em tramitação. Na defesa desse seu projeto José Sarney argumenta que os negros brasileiros enfrentam “maiores dificuldades de acesso às escolas e de permanência nela” e que “seus índices de analfabetismo e de atraso escolar e reprovação são muito superiores em relação aos níveis da população classificada como branca”. Assim, defende que instituição do sistema de cotas “deveria ser encarada com muito mais objetividade e não ficar apenas na discussão étnica”. Também argumenta: as ações afirmativas – ou discriminação positiva – são consagradas no Direito brasileiro, que dá às empresas de pequeno porte tratamento “favorecido”, protege o mercado para a mulher, dá proteção especial à criança e ao adolescente, e prevê a reserva de percentual dos cargos e empregos públicos para os portadores de deficiência. A promoção da raça negra, continua Sarney, está, portanto, perfeitamente referendada pela Constituição Federal, que no artigo 215, prevê: "O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais populares, indígenas e afro-brasileiras, e de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional". Mesmo sem a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial, o Sistema de Cotas idealizado pelo presidente Sarney tem sido fonte de inspiração para várias universidades brasileiras, entre essas a Universidade de Brasília, que desde 2003 o adota.

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