Por José Marques Jardim
Se a França tem seus cafés, a Inglaterra seus pubs e a Itália, suas cantinas, o Amapá tem o Bar do Abreu. Na opinião do sociólogo Fernando Canto, contumaz frequentador do local , o Abreu é o que mais se aproxima da ideia conceitual de um bar, com as relações quase familiares entre fregueses, proprietários e garçonetes, a ideia do fiado, de proximidade e do “balcão”, onde todos se conhecem e se encontram para conversar.
E para homenagear os 28 anos de fundação do Bar do Abreu, um dos seus freqüentadores ilustres lança na sexta-feira, 13, de agosto, o livro “Papo de boteco – crônicas e contos escritos no Bar do Abreu”. De acordo com Renivaldo Costa, a idéia do livro e da data é para espantar os “espíritos de porco” que ousarem rondar o bar naquela data.
Segundo o autor, a obra é despretensiosa, mas vem referendada por um time de peso: o prefácio é assinado pelo escritor Paulo Tarso Barros e há, ainda, comentários assinados pelo sociólogo Fernando Canto, pelo dramaturgo Antônio Abujamra, pelo músico Leo Gandelman, pela cantora Ana de Hollanda e por Paulo Cesar Rodrigues, filho de Nelson Rodrigues, de quem Renivaldo Costa é um devotado leitor.
São 104 páginas de puro humor, refinada ironia e uma envolvente demonstração de erudição do autor, que navega pelo existencialismo de Sartre mas sem perder o foco nos filósofos de botequim, como o piloto Paulinho “Xiri”: “Beber é uma necessidade, saber beber é uma ciência, embriagar-se é uma infâmia”, diz num trecho.
São 44 textos, dos quais na metade o sociólogo Fernando Canto, amigo há vários anos do autor, é recorrentemente homenageado, como na crônica “Carta ao amigo Fernando Canto”, cujo trecho diz:
Certa vez, numa conversa no Bar do Abreu, o Fernando Canto me disse existir o "point of no return ". O ponto de não retorno. Um lugar que não podemos ultrapassar, um fato, um encontro, uma crise, uma doença, uma queda, por não haver volta incólume. Para o bem e para o mal. Um instante em que a alma e os instintos mudam, as vontades ficam parecendo lagartas prestes a sair do casulo transformadas em outro ser. De algum modo cheguei lá. Seja por exaustão, encanto, ou outro vendaval, precisei mudar. Sob certos aspectos e renúncias até me assusto. Mas, pela primeira vez, sinto-me em paz e feliz com isso. Pena que é desgastante e leva tempo até aparar todas as arestas, apagar os rastros, os sinais, as dores. Isto, no entanto, não deve nos impedir. Mas o livro também traz histórias pitorescas, como a crônica “conversa sobre apelidos”, onde o autor revela codinomes guardados a sete chaves.
Ninguém é besta de chamar um governador pelo apelido. Mas nos bastidores do poder ou nas conversas etílicas quase todos recebiam codinomes. Por aqui ninguém sabia, mas o capitão Janary Nunes era conhecido nos meios políticos do Pará como "Napoleão do Tucupi", apelido que lhe foi dado pelo ex-governador Magalhães Barata. Amílcar Pereira tinha muito medo de errar e, principalmente, cometer alguma irregularidade que viesse a desabonar seu governo. Essa mania, ou melhor, essa fobia, junto com o fato de ser naturalmente lerdo, retardavam as decisões governamentais. Resultado: Amílcar saiu do governo com o apelido de "Preguiça". Pauxy Nunes só era tratado por "Xixito" pela Folha do Povo, jornal de oposição, por causa de sua fama de boêmio. José Francisco de Moura Cavalcante, um pernambucano nomeado por Jânio Quadros para substituir Pauxy, tinha um topete parecido com o do Itamar e usava vaselina no cabelo. Simpático, bom discurso, Cavalcante até gostou de ser chamado de "Zé Bonitinho" pelos amapaenses.
Outro homenageado é o jornalista Hélio Pennafort, com quem Renivaldo Costa conviveu, no início da atividade jornalística. Das muitas histórias de Hélio, o autor cita algumas como do episódio a seguir:
Aconteceu no dia 23 de janeiro de 1958, quando esperávamos o avião da Cruzeiro, na época um DC-3, que levaria para o Rio de Janeiro o corpo do deputado Coaracy Nunes, morto dois dias antes num desastre de avião no Carmo do Macacoari. Havia muita gente no aeroporto e a tristeza era geral. Quando o avião estacionou, o Jomar Tavares (que quando morou por aqui foi jogador, juiz e técnico de futebol) conversava com mais dois na minha frente. De repente ele se espantou ao reparar o prefixo do avião: PP-CCM. Tomado de superstição, ele apontou para a aeronave, avisando a seus parceiros que muita coisa ruim poderia acontecer ao Território. É que já ouviu falar que coisa boa não acontece quando uma tragédia pode ser reproduzida por um grupo de letras que, coincidentemente, se tornem visível no momento. E tornou a mostrar o prefixo do aparelho. "Não estou te entendendo, Jomar, que é que tem a ver o futuro do Território com o prefixo do avião", disse um dos amigos. Jomar segurou o amigo pelo braço e explicou: O prefixo do avião é PP-CCM, que em linguagem aeronáutica significa "Papa Papa - Charlie Charlie Mike", mas o diabo que pode significar também: PUTA PARIU - COARACY CAIU MACACOARI.
A edição do livro “Papo de boteco” contou com apoio da Prefeitura de Macapá, da Câmara de Vereadores, Vereador Clécio Luiz, Clínica Inneuro, Nossa Papelaria, Hotel Atalanta, Porpino Nunes Advogados Associados e Confraria Tucuju.
Serviço:
Lançamento do livro “Papo de boteco – crônicas e contos escritos no Bar do Abreu”, 104 páginas, ilustrado com fotografias
Local: Bar do Abreu: Avenida FAB – Galeria Comercial
Data: 13 de agosto, sexta-feira, a partir das 20h.
Preço do exemplar: 10 reais
Entrada Franca
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