quarta-feira, 8 de julho de 2009

Eleições 2010: Campanha contra o Senado

OPORTUNISMO DE HIPÓCRITAS
Carlos Nina


Em dois recentes episódios do Senado, um presidente da instituição renunciou após acusação de recebimento de propina de pequeno valor nesse tipo de transação, já incorporada à cultura e indissociável da história e das tradições de praticamente todas as atividades lícitas e ilícitas deste País. Outro, por força desses valores, também renunciou porque aceitou ajuda do empresariado - sempre solícito e solidário com autoridades em dificuldades ou nem tanto - para pagar obrigação pessoal de alimentos.
Renunciaram porque que quiseram. Poderiam ter ficado e enfrentado o julgamento das acusações que lhes eram feitas. Por razões íntimas, decidiram pela renúncia. Ninguém os obrigou a assinar a renúncia. Poderiam ter exigido o direito constitucional ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa, requisitos fundamentais para um julgamento justo a que todos têm direito. Logo, por maior que tenha sido a pressão que receberam, não poderão, jamais, atribuir a ninguém a decisão final pela renúncia. É ato exclusivamente pessoal.
Exatamente por isso é mais um absurdo dos julgamentos sumários que a mídia brasileira faz condenar e até insultar o presidente José Sarney por não querer renunciar ao cargo para o qual foi eleito.
Não estou, com isso, dizendo que Sarney é inocente ou que é culpado. Afirmo, apenas, que a decisão de renunciar ou não à presidência do Senado é totalmente pessoal e deve ser respeitada. Se há acusações contra ele e as quer enfrentar, deve ser respeitado por isso, e não insultado. A ofensa pessoal, que extrapola a crítica à conduta pública, é recurso de quem não tem argumento.
As acusações contra Sarney seriam absurdas se não fizessem parte, também, da história, das tradições, dos hábitos, da rotina de parlamentares de todos os legislativos do País, municipais, estaduais e federais, de governos federais, estaduais e municipais, de tribunais de todas as instâncias.
No caso das nomeações de parentes, a pena seria só para o cargo de Presidente do Senado? Se não, quantos senadores teriam que renunciar? Quantos deputados federais, estaduais e vereadores? Quantos presidentes de tribunais, ministros e desembargadores? Quantos ministros e secretários de Estado? Quantas outras autoridades que assim procedem?
Então, se realmente isso é uma irregularidade, que se apure na forma que os constituintes de 88 proclamaram: através do devido processo legal, já que o presidente Sarney não quer – e é direito seu – renunciar.
Outra acusação é de tráfico de influência para beneficiar negócio de parente. E de que brotam inúmeras decisões do Executivo e o Judiciário? Quantas vezes, até para dar efetividade a uma decisão justa, o jurisdicionado não precisa ter um canal de comunicação com o julgador?
Isso sem falar nos casos em que esse tráfico é apenas uma atividade que nem chega à autoridade. É apenas um meio de vida de atravessadores de falsas facilidades. Com isso não estou afirmando que, também nesse caso, Sarney seja culpado ou inocente. Deve, como qualquer outro, ser apurado, se realmente houver indício para isso. Ou será correto presumir que o presidente do Senado não tem direito às garantias constitucionais, inclusive do direito à imagem e à honra pessoal?
No caso da omissão patrimonial, valem as mesmas perguntas feitas sobre as nomeações. Ou omissões desse tipo só não podem ocorrer com o presidente do Senado?
Contudo, as pressões da oposição fazem parte do exercício democrático. Assim como a manifestação da mídia – contra ou a favor - e as reações defensivas de Sarney. É fato público e notório que José Sarney incomoda porque tem sido um eficiente e eficaz aliado de Lula, como nenhum outro, desde as eleições deste em seu primeiro mandato. E é um aliado temido pela inteligência política que tem e pela capacidade de superação e resistência, do que tem sido prova essa crise que está atravessando.
O que me leva a essas considerações não é a intenção de defender, como também não é a de acusar José Sarney, mas a indignação com o oportunismo de hipócritas, o dedo em riste de quem não tem autoridade moral para acusar ninguém.
O Presidente do Senado tem sido criticado por quem já se serviu desses mesmos favores que agora apontam como aberração: empregos, passagens aéreas, contratos etc.
Nessa farsa, sobressai-se, para mim, a OAB, cujos dirigentes fazem discursos de arautos da moralidade, em contradição com o autoritarismo, a imoralidade e a corrupção que grassa nos seus bastidores. Engrossam o coro dos oportunistas, como se a Ordem tivesse direitos que outros não podem ter. São os mesmos que estavam no Conselho Federal da OAB, em Brasília, quando esta inaugurou o seu museu, em 2003. E não sou eu quem diz. Está no site da instituição – se não tirarem depois desta crítica -, onde se lê, com direito a fotografias do evento: “o então Presidente do Senado, José Sarney, teve destacado papel no processo de sua criação, ao gentilmente designar a funcionária responsável pelo Museu do Senado Federal, Sra. Tânia Toledo Tenório, para dar suporte técnico ao projeto instalado na OAB.” (
http://www.oab.org.br/museuOAB/criacao.asp).
Será que a OAB não tinha condições de pagar um museólogo? O que torna a OAB imune aos princípios da administração pública?
Sarney, realmente, está enfrentando uma crise pessoal, pela sua força política, movida menos pela moralidade e mais pelos interesses contrariados, ou por puro oportunismo de hipócritas. A crise que Sarney enfrenta resulta da que realmente é do Senado. Mais que do Senado, é do sistema político, da sociedade brasileira, de valores morais.
Sua renúncia não vai resolver a crise do Senado. Se resolvesse, o Senado não teria mais problemas. Com sua firmeza, Sarney está sendo o bode expiatório de todas as mazelas, assumindo, pelo silêncio, vícios de outros pares. O problema do Senado não é José Sarney. São as práticas dos senadores, suas ações e omissões. E estas são reflexos da sociedade. Afinal, na democracia representativa, todo poder emana do povo e em seu nome é exercido. Sacrificar Sarney não purifica o Senado.
A solução da crise dos Parlamentos não está dentro de seus plenários, mas na consciência de cada eleitor no dia da votação.

Carlos Nina é membro do Instituto dos Advogados Brasileiros e x-Conselheiro Federal da OAB
Enviado por Marita Freitas - São Luís
maritafreitas@uol.com.br

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