Há que se louvar, neste episódio, primeiramente, a elegância litúrgica adotada em todo o processo pelo presidente do Senado, José Sarney, contra quem Demóstenes já levantou o dedo com voz ríspida em uma hora crítica.
Depois da prova
Escolha, o Senado não tinha: cassou Demóstenes Torres pelo expressiva margem de 56 votos a favor, 19 contra e cinco abstenções. Redimiu a instituição de um perigoso descrédito, evitou seu aviltamento nefasto à democracia. A Casa não saiu maior, mas se saiu honrada. Já para o conjunto dos senadores, a cassação não chega a trazer alívio e conforto. Fosse Demóstenes um senador medíocre, daqueles que chegam ao Senado apenas para despachar assuntos paroquiais e até negociais, flagrado em tenebrosas transações, cassá-lo seria um ato cirúrgico desagradável, mas necessário, e de efeitos com certeza positivos. Mas Demóstenes era um senador da elite da Casa e o nome mais reluzente da oposição. Um dos senadores mais preparados e atuantes, e também o mais enfático defensor da ética e da moralidade, o mais duro acusador, o mais impiedoso com seus adversários, o mais indiferente à devastação das reputações de seus colegas, provadas ou não as acusações. Em seu discurso de defesa ele listou, e não mentia, inúmeros projetos e questões jurídicas ou legislativas que contaram com sua atuação ou colaboração. Ele era tudo isso mas, em algum momento, descobriu-se que tinha uma espécie de segunda vida, na qual colaborava como Cachoeira em sua condição de senador. A descoberta produziu espanto e indignação que certamente seriam menores se ele tivesse um outro perfil. Por isso, para o conjunto de senadores, a cassação ainda não é a redenção nem os faz maiores. Em se tratando de Demóstenes, o rei da ética, é natural que os cidadãos indignados agora façam uma pergunta: “Se ele, que nos parecia o melhor de todos, não passava de um farsante, o que devemos pensar dos outros?” Assim, para o Senado, hoje é um dia melhor do que ontem. Já os senadores, além da ressaca pelo ato praticado com desconforto, conforme confissões da maioria, enfrentarão continuadas desconfianças e exigências da sociedade, às quais terão de responder com uma atuação individual e coletiva de maior qualidade, embora tenham passado pela dura prova de, pela segunda vez na história da Casa, cassar um colega. Há que se louvar, neste episódio, primeiramente, a elegância litúrgica adotada em todo o processo pelo presidente do Senado, José Sarney, contra quem Demóstenes já levantou o dedo com voz ríspida em uma hora crítica. O mesmo vale para o senador Renan Calheiros. Quatro senadores atuaram exemplarmente, observando a técnica e os ritos processuais para além das equações políticas: no Conselho de Ética, Antonio Carlos Valadares e Humberto Costa, presidente e relator, respectivamente. Na Comissão de Constituição e Justiça, Eunício Oliveira e Pedro Taques, presidente e relator, respectivamente. No plenário, uma civilizado comedimento verbal, e o voto secreto que deve ter sido usado ali pela última vez nestes casos. Agora, tratem senadores e deputados de dar rumo ou final honroso à CPI do Cachoeira.
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