quarta-feira, 9 de maio de 2012

Movimento suprapartidário pressiona para incluir a imprensa na apuração


Poucos admitem publicamente, mas existe entre integrantes da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Congresso que apura relações de Carlos Augusto Ramos com agentes públicos e privados um movimento suprapartidário a favor da investigação das relações do empresário de jogos de azar – conhecido como Carlinhos Cachoeira- com a imprensa, ou, mais precisamente, com a revista “Veja”.
Em reação, um grupo de parlamentares se mobiliza para evitar a convocação de jornalistas. O deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) aponta a existência de impedimento legal para o depoimento de jornalista. E também o risco de rompimento do princípio da “proteção constitucional da atividade jornalística, que inclui o sigilo da fonte, mas não só ele”.
Além do senador Fernando Collor (PTB-AL), autor de requerimento convocando Policarpo Júnior, redator-chefe da revista da Editora Abril, para depor na CPI – “com o propósito de esclarecer eventuais ligações e troca de informações” com Cachoeira e seu grupo -, setores do PT e do PMDB também defendem que a investigação chegue à imprensa.
Para pessoas contrariadas com reportagens da “Veja”, transformar a revista em alvo de investigação poderia servir como uma espécie de “acerto de contas”. Escutas telefônicas realizadas pela Polícia Federal em operações de investigação de Cachoeira sinalizam que ele pode ter sido fonte de reportagens da revista.
“As gravações envolvendo Policarpo mostram não uma relação nos marcos legais entre um jornal e uma fonte. E sim um indicativo de atividade criminosa, de espionagem policial e espionagem empresarial”, afirma o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP). Ele diz ser “defensor radical” da liberdade imprensa, mas, acha que a prática não pode ser confundida com crime. “Invasão de domicílio, espionagem e estar mancomunado com o crime organizado não é jornalismo.”
O líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA), avalia que, depois de analisados “os fatos e os dados”, deve ser analisada a conveniência de convocar ou não o jornalista para depor na CPI. “Se chegarem à conclusão de que precisamos chamá-lo, não há porque ter medo. E, se houver elementos que caracterizem crime, a CPI pode remeter [o caso] para investigação de outra instância judicial”, diz Pinheiro.
O deputado Sibá Machado (PT-AC) afirma que “pessoas da revista estão no centro do debate” da CPI e, portanto, devem ser convocadas. “O envolvimento com Cachoeira é forte e ele é responsável por gravações e vídeos [usados pela revista]. Há áudios deles com Cachoeira muito comprometedores.” Para ele, se a CPI não convocar Policarpo, perde um pouco o sentido.
O impedimento legal, segundo Miro, é o artigo 207 do Código de Processo Penal, segundo o qual “são proibidas de depor as pessoas que, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, devam guardar segredo, salvo se, desobrigadas pela parte interessada, quiserem dar o seu testemunho”. Para o deputado, uma CPI pode até convocar jornalista, mas o profissional não pode depor. Miro não acredita que a CPI tomará esse caminho.
“Há votos de ministros do Supremo Tribunal Federal dizendo que jornalista tem que investigar. É o direito do povo à informação. O que é inerente à atividade é o dever de investigar. Então, por isso, o jornalista não pode nem chegar aqui e dizer que abre mão de falar. Isso aqui não está à disposição do jornalista.”
O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) acha que não há limitação formal jurídica para que um jornalista deponha, mas considera haver “impedimento político”. O foco da CPI, segundo ele, é outro, ou seja, apurar as relações de Cachoeira com o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO), com governadores e com a construtora Delta.
“Mesmo que tenha tido algum contato de jornalista com Cachoeira, isso é tangencial. Pode até ser função do jornalista. Ele está proibido de fazer uma ligação para Fernandinho Beira Mar, se quiser uma informação dele? O jornalista tem que estar perto [das fontes], inclusive de contraventores”, diz Randolfe.
O diretor de redação da “Veja”, Eurípedes Alcântara, afirmou ser uma “afronta à democracia” a convocação de um jornalista para depor em um tribunal político. “É assombroso que na semana seguinte às comemorações do Dia Mundial da Liberdade de imprensa, um senador peça a convocação de um jornalista para depor diante de um tribunal político e, com isso, envergonhe o Brasil, colocando-nos na má companhia de nações atrasadas e repudiadas pela comunidade internacional”, disse.
Segundo ele, “a imprensa não está acima da lei, mas não pode ser colocada ao desamparo dela. Um jornalista acusado, como qualquer cidadão, tem o direito de saber o que pesa contra ele no âmbito da justiça. Colocá-lo diante de um tribunal político com o objetivo de “esclarecer eventuais ligações” com quem quer que seja é um despropósito e uma afronta à democracia”.

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