A tragédia dos homicídios
O Brasil inteiro vive a perplexidade da violência,
especificamente dos crimes hediondos que estão a estarrecer a sociedade
brasileira. Liga-se a televisão e logo vem a notícia de um homicídio, que às
vezes é um exemplo a estimular a continuidade desse processo; um criminoso, com
a cara mais limpa do mundo, a afrontar todos nós, saindo de um júri ou sendo
solto depois de cometer um assassinato. É que a legislação brasileira, inédita
no mundo, permite aos criminosos de morte defenderem-se soltos. Por outro lado,
sob a alegação da atrocidade que é o nosso sistema prisional, que se constitui
em universidade do crime, o bandido condenado a 20 anos de prisão tem a
progressão de pena e está solto depois de cumprir três anos. As estatísticas
brasileiras são terríveis. Estamos no ranking mundial em situação vexatória. A
Índia que tem uma população 500% maior que a brasileira teve 20% menos
assassinatos que o Brasil. Em 2011 tivemos 51.330 pessoas mortas por homicídio.
O Mapa da Violência 2012 afirma que em 30 anos foram mortos no Brasil 1 milhão
e 90 mil pessoas. Isso é mais do que as vítimas de todas as guerras que tivemos
no Brasil em história. A do Paraguai, 100 mil, a Cabanagem 40 mil, na tragédia
de Canudos cinco mil, na do Contestado também cinco mil. Na Balaiada, na
Independência, na Guerra Cisplatina, na dos Emboabas, na luta contra os
holandeses, alguns milhares. Os brasileiros mortos em todas as nossas guerras e
revoltas, somados, estão longe de atingir um quinto do número de assassinatos
durante as três últimas décadas. E o que mais choca é o fato de 70% dessas
mortes os envolvidos, vítimas e autores, estão na faixa entre 17 e 25 anos,
isto é, a juventude está morrendo e está matando. A imprensa mundial tem
ressaltado esses números, projetando uma imagem muito ruim do nosso país. Mas a
verdade é que a tendência é de aumentar com os últimos números divulgados,
referentes a este ano. Há 30 anos no parlamento dou um diagnóstico e prescrevo
uma solução para esse problema. Atribuo ao fato da Lei Fleury, justamente
aquela que permite o criminoso de morte, repito, defender-se solto. Então
mata-se sem ter a consciência de que ao extinguirmos uma vida estamos perdendo
a nossa. Justamente os países que têm menor índice de homicídio são os que têm
pena de morte e prisão perpétua. Não sou adepto de uma nem de outra, mas não
podemos manter essa lei atual brasileira. Temos que fazer com que o criminoso
saiba que ao matar ele será preso e durante todo o processo ficará preso e
cumprirá sua pena ao ser condenado, totalmente. Já apresentei vários projetos
nesse sentido. Mas a resistência de um grupo de advogados da área criminal e
outros que alegam que nossas prisões não cabem mais gente fazem lobby e não têm
deixado modificar a legislação atual. Enquanto isso, continua a matança. E,
para as vítimas, somente terem perdido o direito de viver, deixando mães,
filhos, famílias no desespero e na miséria. Outro projeto de minha autoria
também estabelece a obrigação do Estado de dar assistência às vitimas. Mas,
também, está hibernando na Câmara dos Deputados. Aqui, também, somos atingidos
por essa onda de violência. Temos que conscientizar a população do valor da
vida e que, quem mata, perde também sua vida, na prisão.
José Sarney foi governador, deputado e senador pelo Maranhão, presidente da República, senador do Amapá por três mandatos consecutivos, presidente do Senado Federal por três vezes. Tudo isso, sempre eleito. São 55 anos de vida pública. É também acadêmico da Academia Brasileira de Letras (desde 1981) e da Academia das Ciências de Lisboa.
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