sexta-feira, 1 de agosto de 2008


A hora e a vez das listas


Houve um tempo em que a legislação eleitoral não permitia a presença de soldados nas proximidades das seções eleitorais. Procurava-se proteger os eleitores contra a coação do poder público. Agora, a discussão é como colocar a polícia dentro das seções eleitorais e como proteger os candidatos para que possam ter o direito de ir e vir. Nenhuma confissão maior do que esta, da falência e da impotência do poder público, acuado pelo crime organizado, gerando um clima de medo e insegurança na sociedade.Esta, aliás, está se mostrando uma eleição atípica. O presidente do TRE do Rio diz que não quer tropas do Exército e o secretário de Segurança do Estado confessa não dispor de força suficiente para "ampliar o policiamento ostensivo nos locais apontados pela Justiça Eleitoral como currais eleitorais". Já a Associação dos Magistrados diz que deseja ajudar a pureza das eleições e organiza a lista dos candidatos sujos. É o Bloco dos Sujos, famoso nos Carnavais de outrora.E a lista é aberta -a qualquer momento alguém pode entrar. O prefeito de São Paulo é um dos retardatários que não escapou da santa inquisição. Mas as listas não são somente da AMB. Os Tribunais de Contas também têm lista própria -o TCU e os estaduais, estes com direito a um anexo chamado "adendo das omissões". O Ministério Público em todos os municípios também tem seu julgamento próprio e entra com impugnações, para não permitir que participem do pleito pessoas com antecedentes criminais ou de má reputação. Isto sem falar na guerra entre candidatos e partidos, impugnando em fogo cruzado uns aos outros. O diabo é que, como dizia Machado, a confusão é geral. Só que com tantos recursos, prazos e denúncias, dificilmente os juízes vão ter tempo de julgar tantas questões em prazo tão estreito.Mas como nada é novo debaixo do sol, Afonso Arinos já contava que, quando era acadêmico em Belo Horizonte, com a homofobia daquele tempo, prenderam um homossexual tendo em seu poder uma lista dos "rapazes da sociedade de BH" que participavam do seu time. E a brincadeira era chamar um colega e alarmá-lo: "Você está na lista". Agora os candidatos estão num dilema parecido.A única esperança que surge vem dos moradores do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. São otimistas e colocaram lá uma faixa-lema: "Aqui se faz política com democracia e liberdade". Ao que parece, é o único lugar em que isso está ocorrendo. No resto do Brasil, pelo que diz a mídia, não se acredita nem numa coisa nem na outra. E a lista dos limpos, por dificuldade de impressão, ainda não saiu.


José Sarney é ex-presidente do Brasil, senador do Amapá e acadêmico da Academia Brasileira de Letras e da Academia de Ciências de Lisboa.
jose-sarney@uol.com.br

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