segunda-feira, 11 de agosto de 2008

A Lei de Anistia


Francisco Dornelles*

Nos primeiros meses de 1984, o então governador de Minas Gerais Tancredo Neves comunicou-me, no Palácio da Liberdade, que pretendia deixar o governo de Minas para candidatar-se a presidente da República. Seria ele o candidato da Aliança Democrática, formada pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) e pelo Partido da Frente Liberal (PFL).
Sendo eu, então, secretário da Receita Federal e mantendo, até por razões de natureza familiar, bom relacionamento com o presidente Figueiredo, Tancredo pediu-me que levasse ao presidente essa notícia. Tancredo quis que eu dissesse ao presidente Figueiredo que ele faria uma campanha de alto nível, criticando políticas do governo das quais discordava, mas que respeitaria sempre a pessoa do presidente da República e procuraria não reabrir feridas do passado que, na sua opinião, deveriam ser rapidamente cicatrizadas.
"Uma vez eleito, o meu governo vai olhar para frente, construir o futuro e não reviver o passado. O que aconteceu ontem pertencerá à história". Esta foi a mensagem enviada por Tancredo Neves ao presidente Figueiredo. Foi na realidade inspirada no primeiro-ministro Winston Churchill quando, analisando a força da Inglaterra, dizia que uma das marcas do país era não esquecer o passado, mas não fazer do passado o futuro. Durante toda a campanha da Aliança Democrática, Tancredo enfatizou seu compromisso com a lei da anistia e com a política de conciliação do país.
O governo do presidente Sarney uniu todas as forças políticas. Assumindo o cargo em decorrência de uma das maiores tragédias da política nacional, o presidente Sarney, com os sentimentos de grandeza e liderança que o caracterizam, venceu obstáculos extremamente complexos e conseguiu consolidar o regime de abertura política, procurando não reviver as situações e os fatos que, em determinado período, dividiram o Brasil e os brasileiros. O governo do Presidente Sarney, consolidou de forma definitiva o regime democrático no país.
Vejo, pois, com enorme espanto e surpresa a proposta do ilustre ministro Tarso Genro, por quem tenho o maior respeito, de reabrir feridas políticas que já estavam praticamente cicatrizadas no país. Qual é a razão específica que leva o ministro procurar ignorar a lei de anistia? Que ganha o país com esta decisão?
O ministro Nelson Jobim, afirmou com muita propriedade, que a lei de anistia já atendeu a seus objetivos, já realizou seus efeitos e não pode ser alterada. Mudar essa legislação, continuou o ministro Nelson Jobim, seria a mesma coisa que revogar aquilo que já foi decidido anteriormente, que foi a pacificação nacional.
A anistia política ampla, geral e irrestrita foi uma reivindicação de todas forças políticas do país, que estiveram no poder e na oposição, no período 1964-1982. A anistia abrange os dois lados. Fatos ocorridos nesse período não podem ser esquecidos, mas não devem também ser revividos. Devem servir de lição para que não venham ser repetidos, mas não devem ser objeto de vingança, por ser esta incompatível com o projeto de conciliação nacional, que foi um dos símbolos de todos aqueles que defenderam e consolidaram a Nova República.
A proposta do ilustre ministro Tarso Genro reabre feridas que estavam cicatrizadas. Nada constrói e só desunião pode criar. Seria importante que o presidente da República deixasse bem claro que a proposta do ilustre ministro Tarso Genro de ignorar a Lei de Anistia tem um caráter estritamente pessoal e que não reflete a posição do governo e do presidente da República.

* Ex-Ministro de Estado e atual senador pelo PP do estado do Rio de Janeiro

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