Há
oito anos era sancionada a Lei Maria da Penha, considerada pela ONU a terceira
melhor legislação do mundo no enfrentamento à violência contra a mulher. Após a
sanção, em 7 de agosto de 2006, houve significativas mudanças no modo de
encarar as relações de gênero, em que a opressão contra a mulher, alicerçada em
uma cultura machista, era tida como uma infração menor. Esse dispositivo é
fruto do grito de milhares de brasileiras vítimas de violência doméstica e
familiar. Até 2006, não era possível encontrar um respaldo legal adequado que
coibisse as brutalidades. E, infelizmente, foi necessária uma grave injustiça
contra uma delas, Maria da Penha Maia Fernandes, para que hoje se possa
celebrar o começo da luta pelo fim da violência de gênero. A heroína cearense
poderia ter dedicado a vida a cultivar a própria dor, mas não o fez. Preferiu transformar
o inferno pessoal em exemplo de resistência, trazendo luz às demais histórias
de mulheres no país. Sua experiência se assemelha à vivida por outras cidadãs
anônimas, cujo perigo está não fora, mas dentro do lar. Foram 19 anos de
impunidade nesse caso. Com o clamor do caso Maria da Penha, o governo e o
Congresso movimentaram-se para editar normas mais rígidas contra a violência
doméstica. Conforme pesquisa do DataSenado, em 2013, o índice de conhecimento
da Lei Maria da Penha era de 99% e o sentimento de proteção pela legislação
alcançava 66% das mulheres. Quanto à sua efetividade no combate à violência
doméstica, ainda há desafios a serem superados. Um dos principais é aumentar a
conscientização das vítimas para denunciar. Estima-se que 700 mil brasileiras
sofrem agressões físicas, psicológicas, ou as duas juntas, e 13 milhões das
mulheres (18% da população acima de 16 anos) já foram vítimas de algum tipo de
violência. Entre os avanços garantidos pela Lei Maria da Penha, estão a criação
e o fortalecimento de varas e juizados especializados em violência doméstica e
familiar contra a mulher, de delegacias especializadas no atendimento à mulher,
de núcleos especializados para mulheres em defensorias públicas e de
casas-abrigos. Nesse contexto, o Congresso concluiu a CPMI da Violência Contra
a Mulher. Os resultados obtidos pela CPMI contribuem significativamente para
que os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, de todas as esferas
administrativas, possam elaborar políticas e ações que permitam enfrentar as diversas
formas de violência que atingem as brasileiras. Na ocasião, foram propostos 13
projetos de lei e um projeto de resolução. Entre eles, está o PLS nº 292/2013,
que institui o feminicídio como qualificador do crime de homicídio. Segundo
pesquisa do Ipea de 2013, a cada hora e meia, uma mulher morre vítima de violência.
A cada dia, são 15. A cada mês, 472. E essa estatística tem sido crescente. O
Brasil, hoje, ocupa a vergonhosa 7ª colocação, entre 84 países, nas taxas de
feminicídio. A importância de tipificar esse crime é reconhecer, na forma da
lei, que mulheres têm a vida ceifada pela razão de serem mulheres. É combater a
impunidade de feminicidas que são beneficiados por interpretações jurídicas
anacrônicas, como a de terem cometido crime passional. Sendo assim, a luta pela
superação da violência é dever de todos os poderes constituídos e de toda a
sociedade. A violência contra as mulheres é atentado à democracia, favorece a
discriminação e compromete o desenvolvimento das futuras gerações. Como
salientado pelo secretário-geral da ONU, “há uma verdade universal, aplicável a
todos os países, culturas e comunidades: a violência contra a mulher nunca é
aceitável, nunca desculpável, nunca tolerável”.
Vanessa Grazziotin é senadora do Amazonas pelo
PCdoB e procuradora da mulher do Senado
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