domingo, 31 de outubro de 2010

José Sarney

O Senado sem Tuma

O Senado, dizia Milton Campos, é uma Casa em que, além da convivência política, por sermos poucos e passarmos muitos anos juntos, criam-se relações de amizade e de afeto que muitas vezes se transformam quase em irmandade. No Senado do Império, que era vitalício, há a célebre sentença do Marquês de Abrantes, que, presidindo uma sessão e começando uma altercação entre senadores, advertiu: “Nada de brigas, vamos lembrar que temos de viver juntos a vida inteira.” O Senador Tuma era uma dessas figuras que cultivava a boa convivência, sempre disposto a colaborar para manter um bom ambiente dentro das sessões e sempre disposto a evitar divergências. Era um homem bom, querido pelos colegas e pelo funcionalismo da casa, que tratava com carinho e deferência. Com a saúde abalada, o coração sustentado pelo seu amor ao trabalho, não recusava tarefa, nem aquelas de cerimonial e representatividade, comparecendo a todas as solenidades e reuniões que dissessem respeito aos trabalhos ou ao prestígio de Senador. Corregedor da Casa desde que o cargo foi criado, sua experiência profissional fazia com que as questões fossem tratadas e resolvidas sem sensacionalismo. Era um policial com alma de frade, cumprindo com seus deveres silenciosamente. Tratava diariamente de todos os assuntos da pauta, aprofundando-se no estudo das matérias, sendo um trabalhador infatigável. Marcava sua personalidade ter sido delegado quando Lula foi preso e ele deu um jeitinho brasileiro, com um toque de bondade, para permitir que Lula fosse ao velório de sua mãe, a quem era ligado pela vida de sofrimentos e de lutas. O Presidente Lula reconheceu ter sido tratado com humanidade pelo Delegado Tuma. Quando fui Presidente da República o convidei para Diretor da Polícia Federal, não tive nenhum problema com aquele órgão, que agiu sem truculência nem perseguição a quem quer que fosse, amigos ou adversários do governo, agindo sempre dentro da lei. Tuma não tinha inimigos nem adversários no Senado e sua morte foi sentida e lamentada por toda a casa, como raramente acontece nestes momentos de perda. Com ele mantive desde o tempo em que trabalhamos juntos uma estreita amizade. Devo-lhe o carinho e a atenção de sua generosidade sempre presente, inclusive nos momentos mais difíceis. Perdemos um senador dos mais eficientes do Senado e eu, pessoalmente, um amigo a quem admirava pelas suas virtudes pessoais, morais e humanas. Ele fará grande falta ao Senado e deixa uma lacuna que vamos custar muito a preencher.

José Sarney

foi governador, deputado e senador pelo Maranhão, presidente da República, senador do Amapá por três mandatos consecutivos, presidente do Senado Federal por três vezes. Tudo isso, sempre eleito. São 55 anos de vida pública. É também acadêmico da Academia Brasileira de Letras (desde 1981) e da Academia das Ciências de Lisboa.

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