Sou Sarney, e daí?
Colegas queridos, gente do bem, acabam caindo na orquestração anti-Sarney e falam mal de sua nova – e quarta – eleição para presidir o Senado Federal. Ora, meus amigos, como é que se pode condenar um homem que foi presidente da República, deixou o poder e ainda disputou três eleições para o Senado, podendo gozar as delícias de sua São Luiz, onde tem uma bela casa na praia do Calhau. E ainda vem ao Rio para as reuniões da Academia Brasileira da qual é membro. Aliás, também faz parte da Academia de Lisboa e poderia, portanto, frequentar aquela que é a mais encantadora cidade da Europa e onde possui amigos e tem seus livros editados.
Façamos as contas! Sarney foi suplente de deputado federal, eleito em 54, e assumiu parte do mandato. E, de 58 para cá, esteve sempre no exercício de mandatos eletivos. Será que o povo é tão despreparado que elege há mais de meio século um político que não seja merecedor de reiteradas manifestações de apreço? Será que o nosso saudoso dr. Tancredo Neves, louvado justamente por vocês todos que criticam o Sarney, escolheria ou aceitaria para seu vice um homem que não fosse dotado da mais ilibada reputação e vida pública? E José Aparecido? O Odilo Costa, filho? O Ferreira Gullar? O Renato Archer, que fez oposição ao Sarney e acabou seu ministro? Os acadêmicos elegeriam quem não tivesse mérito para a imortalidade? E teria dois de seus filhos eleitos e reeleitos?
Sarney criou as bases da CPLP e do Mercosul que Itamar acabou por concretizar. Diga-se que, sem os dois, tais entidades jamais existiriam, pois FHC e Lula deram pouca bola para ambas. Lula ainda ajudou a criar o problema da presença da Venezuela de Chávez no Mercosul, que dará trabalho nos próximos anos.
Logo, convenhamos que esta campanha contra um homem com vida pública tão longeva, cercado de gente de qualidade – inclusive uma notável mulher, que é D. Marli –, é fruto da mesquinharia de gente menor, que explora um sentimento nobre da sociedade que é a revolta contra os políticos em geral. Mas Sarney não é símbolo destes – todos eleitos pelo povo, é claro –; o sistema é que nos proporciona uma democracia caríssima. Os militares, que também gostam de falar mal, limitavam salários de políticos, com vereadores do interior trabalhando aos sábados, o que era suficiente, sem ganhar. E cortavam na carne, como na cassação do senador da ARENA que foi apanhado em flagrante extorsão e foi inocentado pelo Senado.
Sarney tem servido ao Brasil e não a regimes e a presidentes. Não fosse assim, não estaria tão forte e respeitado. E, como presidente da República, vale uma consulta aos números oficiais (nunca contestados), que não costumam mentir, que mostram os avanços em obras e no social. Na política, governou com uma Constituinte enlouquecida, que tornou o país quase ingovernável e, ainda por cima, abriu mão de um ano do mandato para o qual fora eleito com Tancredo.
Amigos queridos me perdoem, mas vamos mais devagar às críticas a Sarney. Não podem falar de sua casa na Praia do Calhau e ficarem mudos com os apartamentos de mil metros de outros que vocês adoram, por serem intelectuais e se vestirem como europeus. Nada demais, mas, se for para criticar, vamos diversificar.
Aristóteles Drummond é jornalista carioca. Escreve artigos semanais publicados no Caderno Domingo do jornal Hoje em Dia, de Belo Horizonte, Diário de Petrópolis, Diário de Barretos, Correio da Serra, de Barbacena e no Diário do Comercio de São Paulo. Membro do PEN Clube do Brasil, do Sindicato dos Escritores do Rio de Janeiro e da Associação Cultural da Arquidiocese do Rio, Leia mais..
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