Cinzas e ventos
É o velho e sábio Salomão quem nos diz — e tem sido repetido ao longo dos milênios — que “nada há de novo debaixo do sol”. Esse texto está inserido quando fala que há dia para plantar e para colher, chegando a dogmatizar que “uma geração vai e outra geração vem, mas a Terra permanecerá para sempre”. Agora, são tantas as catástrofes que se acumulam em espaços cada vez menores de tempo que a gente chega a pensar que começa a existir alguma novidade debaixo do sol. O hemisfério norte nestes dias está envolto em cinzas, cobrindo em parte a Islândia, a Dinamarca, a Noruega, o Reino Unido, fazendo com que os aviões fiquem em terra, com receio que suas turbinas enfrentem as partículas de quatro gramas por dez metros cúbicos de ar das cinzas do Grimsvotn, este vulcão que joga fogo sob as geleiras. Os cientistas dizem que ele é diferente, diferentes suas nuvens, diferente o clima. Mas, na palavra de Walter Oppenheimer, “os vulcões fazem o que querem”. Seus humores são desconhecidos e os homens têm de lidar com eles desde que a nossa Terra passou por fogo, água, contorções e tudo mais até ser como nós a olhamos hoje. Desde a antiguidade eles são ameaças e motivo de medo. Lembremos o mais lembrado deles, o Vesúvio, que sepultou Pompeia e Herculano, cidades romanas que hoje conhecemos como eram, com suas obras de arte e suas calçadas e colunatas, além de mostrar os costumes nada virtuosos da atração entre o homem e a mulher, a inventar modos de sublimar desejos. Era o ano de 79 de nossa era cristianíssima. O maior deles está no Chile, Ojo del Salado, que não é de nada, pois está dormindo na inatividade. O Japão sofreu há pouco tempo o horror do tsunami que deixou a herança de radiação, que vai perdurar por muitos anos, e matou tanta gente na destruição que provocou. Sobre a morte dizia Malherbe que nem os muros do Louvre com suas guardas defendiam o rei. Pois nem a riqueza e a força dos Estados Unidos o livram dos ataques da natureza, nos ventos de tornados e furacões, o ultimo deles o que devastou Joplin, sem esquecer o que sofreu São Francisco no terremoto de 1906. Mas o que há de novo é que sabemos de tudo isto ao mesmo tempo, pelo milagre da tecnologia, e o mais trágico é que a ciência nos diz que a Terra está morrendo pelo aquecimento global, pela alta das águas oceânicas, pelo aumento da temperatura da terra. E quem a está matando? Lévi-Strauss dizia que o homem é essencialmente poluidor. Vamos abrir nossos corações e olhos para não participarmos deste suicídio coletivo, salvando o próprio homem de morrer no seu mistério: o mundo.
José Sarney foi governador, deputado e senador pelo Maranhão, presidente da República, senador do Amapá por três mandatos consecutivos, presidente do Senado Federal por três vezes. Tudo isso, sempre eleito. São 55 anos de vida pública. É também acadêmico da Academia Brasileira de Letras (desde 1981) e da Academia das Ciências de Lisboa.
jose-sarney@uol.com.br
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