Minha
impressão é totalmente recolhida de depoimentos de pessoas de todas as partes
do Estado. Acredito que não há um levantamento atualizado das consequências do
período de chuvas irregular que estamos tendo este ano. Diz-se no nordeste do
polígono das secas que sua melhor indicação são as chuvas no Maranhão, quando
elas aqui começam cedo e são abundantes é sinal de que será um ano bom de águas
para os nossos irmãos nordestinos. O Maranhão
sempre esteve ligado ao problema das secas. Quando não é por falta de chuvas é
pelos problemas que as secas do Nordeste trazem para o nosso Estado. O mais
visível deles, a população. Quando fui Governador do Maranhão, de 1966 a 1970, mandei fazer um
levantamento estatístico sobre a nossa população e uma das constatações mais
reveladoras é de que a metade da população do Maranhão tem origem nordestina.
São descendentes de emigração daquela área. Eu mesmo tenho mãe pernambucana,
avô piauiense, avó paraibana. Quando entrei para a Academia Brasileira de
Letras, o governador de Pernambuco, então Marcos Maciel, doou-me a espada,
dizendo-me “essa é sua metade pernambucana”. A influência dessa migração tinha
por origem as atrações de que aqui é região úmida e o sistema fundiário não
estava perfeitamente definido, o que facilitava o assentamento dos retirantes.
Quanta vezes, menino em Coroatá, nos anos de seca, vi chegar aquela leva de
nordestinos, tangidos pela fome e pela perda de todos os seus bens, obrigados a
emigrar, trazendo apenas a miséria, a boca, o machado e uma família deslocada,
fugindo da seca e do destino que marca a história desse povo sofrido e lutador. Já o Padre
Claude d’Abbeville, na sua história dos padres capuchinhos na Ilha do Maranhão,
relata um depoimento dos índios sobre uma seca tremenda havida no Maranhão que
destruíra as plantações e semeara uma fome grande. Os próprios tupinambás que
habitavam a Ilha de Upaon-Açu, hoje nossa São Luís, eram retirantes do
Nordeste, fugindo da perseguição dos portugueses. Este ano
estamos diante de um período calamitoso. Na capital mesmo choveu muito pouco,
os reservatórios estão secos, na Baixada os campos não encheram e no sertão as
chuvas irregulares fizeram com que se perdessem as roças, pois o arroz não
“encheu o cacho e o milho mirrou”. A produção
agrícola teve uma perda de cerca de 30% e vai necessitar uma ajuda dos bancos
que financiaram a safra, que têm de encontrar uma solução, pois os agricultores
não tem como pagar os empréstimos de financiamento. E a nível
de governo, o que significa? Nossos índices de desenvolvimento social que estão
melhorando vão sofrer de novo o baque, pois a seca que assola o Nordeste fez com
que viessem – emigrassem para o Maranhão –, cerca de 200 000 pessoas, e nós,
que já tínhamos uma população de seis milhões e meio, passamos para seis
milhões e setecentos, a 10ª do Brasil, aumentando assim o número de pessoas
para dividir uma produção que diminuiu, o que faz cair nossos índices. Ainda
desta vez, com as estradas, não foi pequeno o deslocamento de rebanhos que iam
morrer e que vieram em busca de nossos pastos, já escassos. Esse é um
dos aspectos que tem que ser levado em consideração na necessidade de cada vez
mais o Governo Federal ajudar o Maranhão. O
Centro-Sul sai sempre lucrando. Em vez de criarem problemas para as grandes
cidades de São Paulo e Rio, vêm para cá onde com amor distribuímos nossa
pobreza. Eu, filho dessa gente, que o diga. O Maranhão, bom e plural, dessa
mistura fez um povo tão acolhedor e generoso.
José Sarney foi governador, deputado e senador pelo Maranhão, presidente da República, senador do Amapá por três mandatos consecutivos, presidente do Senado Federal por três vezes. Tudo isso, sempre eleito. São 55 anos de vida pública. É também acadêmico da Academia Brasileira de Letras (desde 1981) e da Academia das Ciências de Lisboa.
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