As palavras e a política
Diz-se que sessenta por cento da ação política é a palavra. É ela que expressa o convencimento, que convence, que divulga idéias, que alicia, que desperta paixões e seguidores. A palavra, se na política é assim, na convivência é tudo, cem por cento. É ela que reúne amigos, que faz amores, que cria afetos e carinhos. Com a palavra escrita se eternizam emoções, paisagens, sentimentos, dores, alegrias e se transubstancia a natureza. Uma rosa não é uma rosa, mas a alma da rosa que os poetas consagram. Pela palavra escrita se violam as leis da física, rompem-se as forças da gravidade e magnética, criando heróis que viajam a mundos desconhecidos. Com a palavra escrita se constroem vidas, histórias, modifica-se o tempo. Faz-se dele passado presente e presente passado. O homem não é a mensagem nem corpo, é a linguagem. Dos animais que Deus fez e que habitam a Terra o único que fala é o homem. É ele o interlocutor de Deus, que se proclama pela palavra. Ele fala aos homens. Quem primeiro ouviu Sua voz foi Adão, quando Deus deu-lhe o Paraíso. Na política durante mais de um século as palavras revolução e revolta ocuparam a humanidade, levadas por homens como Lênin, cuja pregação criou o mundo comunista, que quase nos leva à destruição com uma confrontação nuclear. Gandhi, na direção contrária, foi o grande orador que, em vez do chamamento à reação pelas armas, pregava a não-violência e cuja doutrinação levou a Índia à independência. Mas a figura dominante nesses anos do século XX foi Winston Churchill, esse gigantesco poder verbal que abriu os olhos da Europa para o perigo do nazismo e da preparação bélica de Hitler. Depois, a Inglaterra batida, com o moral de seu povo presa do medo com a aproximação da invasão e da derrota, foi sustentada pela voz de Churchill, que jamais vacilou na crença da vitória e manteve a esperança do povo, apelando para a resistência: “Sangue, suor, trabalho e lágrimas.” Lembremos, também, De Gaulle, na crença da glória da França e levantando o coração da resistência na sua palavra de jamais capitular. No Brasil foi a palavra de Nabuco que construiu a consciência nacional para acabar com a mancha negra da escravidão. Rui Barbosa foi outra formidável confirmação da força da palavra. Sua poderosa pregação civilista marcou a História do Brasil, propugnando sempre pela primazia do direito e pelas liberdades civis. A ele devemos muitos dos avanços e reformas que deram ao País a democracia. Outra poderosa voz, a demonstrar que a palavra é sempre a ação política, foi Carlos Lacerda. Sem nada que não fosse sua extraordinária capacidade de convencer, derrubou governos e foi o maior orador do parlamento nacional. Falo desses homens para mostrar o vazio que tem a palavra no atual cenário do País. É um momento de surdez e de cor pálida, para ser educado.

José Sarney foi governador, deputado e senador pelo Maranhão, presidente da República, senador do Amapá por três mandatos consecutivos, presidente do Senado Federal por três vezes. Tudo isso, sempre eleito. São 55 anos de vida pública. É também acadêmico da Academia Brasileira de Letras (desde 1981) e da Academia das Ciências de Lisboa.
jose-sarney@uol.com.br
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