Folha — Como o senhor qualifica o trabalho do SNI naquele período (Governo Sarney/1985-1990), sob o ponto de vista da organização, métodos e transmissão das informações ao Governo?
José Sarney — O trabalho do SNI, naquele período, pareceu-me sempre burocrático, e o seu Ministro-Chefe encontrava-se comigo em reuniões de trabalho, das quais participava com os Chefes da Casa Civil e da Casa Militar, e se restringia a me transmitir notícias que, em geral, já eram do conhecimento da mídia. Logo que assumi, dei instruções para que o órgão suspendesse toda e qualquer atividade no que se referia a investigar a vida particular das pessoas, dizendo que isso não correspondia a nenhum interesse de Estado.
Folha — Olhando em retrospecto, o senhor concorda com as atividades do SNI no tocante à atenção dedicada aos movimentos sociais?
Folha — O SNI tinha autonomia para escolher as "áreas de interesse" de seus trabalhos ou, de alguma forma, o senhor colaborava para indicar essas áreas? Qual era o grau de autonomia do SNI?
José Sarney — Jamais entrei no âmago das atividades do SNI, que me pareciam, praticamente, hibernadas. Se o SNI tinha informações e escolhia áreas de interesse, nunca levou isso ao meu conhecimento.
Folha — Chama a atenção que o SNI, mesmo num governo civil, tenha desenvolvido os mesmos acompanhamentos sobre setores da vida brasileira que marcaram negativamente sua atuação durante a ditadura militar. Por que o SNI foi mantido mesmo sob o seu governo? Por que não foi extinto (como viria de fato a ser, no governo Fernando Collor)?
Folha — O Presidente da República recorria com que frequência aos relatórios elaborados pelo SNI?
José Sarney — Nunca recorri. Se o SNI fazia esses relatórios rotineira e permanentemente, não era para que fossem entregues ao Presidente da República. De maneira que eu não os recebia e, nos meus arquivos, não se encontra nenhum deles.
Folha — Alguma vez o senhor se valeu especificamente dos serviços/informações do SNI para tomar uma decisão de governo? Em caso positivo, qual a decisão específica?
José Sarney — Não.
Folha — O MST foi criado em 1984, um ano antes da posse do senhor na Presidência. Os documentos liberados demonstram que MST e sindicatos de trabalhadores rurais eram objeto de atenção do SNI. Como o senhor acompanhava as movimentações do MST e dos trabalhadores rurais? O senhor era informado sobre reuniões, congressos e eventos do gênero?
José Sarney - De minha parte, não havia nenhum acompanhamento direto — até mesmo porque o MST estava começando — mas apenas informações informais que me eram trazidas pelo Chefe do SNI sobre acampamentos.
Folha — O senhor recebeu informações sobre comícios e outros eventos realizados por candidatos à Presidência durante a corrida eleitoral de 1989?
José Sarney — Não.
Folha — Com que frequência o senhor recebia em audiência o então chefe do SNI, Ivan de Souza Mendes?
José Sarney — Eu o recebia, todos os dias, numa reunião que eu promovia, às 08h30min horas, com todas as autoridades da Casa.
Folha — As questões levantadas ou apuradas pelo SNI eram também discutidas pelo senhor com o general Leônidas Pires Gonçalves, então ministro do Exército?
José Sarney — As pautas relativas aos despachos com o Ministro do Exército eram inteiramente diferentes dos assuntos do SNI, até mesmo porque os militares têm verbas específicas para cada uma das suas atribuições.
Folha — O governo do senhor prestou grande atenção à modernização das Forças Armadas, com recursos extra-orçamentários estimados em US$ 1 bilhão para aquisições de equipamentos e treinamento da tropa. A destinação de tais recursos ajudou o governo a superar eventuais problemas no período de transição do regime militar para o civil?
José Sarney — É verdade. Um dos meus objetivos era profissionalizar as Forças Armadas para retira-las da política, e a única maneira de fazer isso era por meio de um projeto de modernização, engajando-os no treinamento da tropa, superando a situação precária em que se encontravam. Acredito que esse programa tenha dado certo, uma vez que deixei o Governo com as Forças Armadas totalmente voltadas para problemas militares, longe da política.
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