Em audiência pública
realizada nesta segunda-feira (5), a cientista política Lilian Gomes alertou
para os projetos de lei que, segundo ela, visam restringir os direitos dos
quilombolas às suas terras. Como exemplo, a pesquisadora citou a PEC 215/2000,
proposta de emenda à Constituição que transfere do governo para o Congresso a
responsabilidade pela demarcação de terras indígenas e quilombolas. Lilian
Gomes, que é pesquisadora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), fez
essas colocações durante audiência promovida pela Comissão de Direitos Humanos
e Legislação Participativa do Senado (CDH). Suas críticas ecoam protestos
feitos em reuniões anteriores da CDH. Em julho, por exemplo, o
secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber
Buzatto, disse que propostas como essas “criam ainda mais obstáculos ao
reconhecimento e à demarcação de terras indígenas, haja visto o grande poder da
bancada ruralista no Congresso”. Alguns meses antes, em abril, o antropólogo
Alfredo Wagner Almeida declarou que as pressões pela inconstitucionalidade do Decreto 4.887/2003 –
que trata da titulação de terras quilombolas – refletem o “momento de
triunfalismo do agronegócio”.
Mudança de tendência
Ao avaliar os projetos de
lei sobre quilombos que tramitam ou tramitaram no Congresso após a Constituição
de 1988, Lilian Gomes identifica duas tendências. Na primeira, que vai até por
volta do ano 2000, teriam destaque propostas que visavam regulamentar o artigo 68
do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). Esse artigo concede
aos quilombolas o direito às terras onde suas comunidades vivem e foi
regulamentado pelo Decreto 4.887. Na segunda tendência, que se inicia por volta
de 2001, “mas principalmente a partir de 2007” , teriam predominância as tentativas de
restrição dos direitos dos quilombolas. Segundo a pesquisadora, há uma
“artimanha” nas propostas da segunda tendência. Ela argumenta que tais projetos
não são explicitamente contrários aos direitos dos quilombolas, transmitindo a
ideia de que querem efetivar e regulamentar os direitos quilombolas, quando na
verdade pretendem restringi-los.
Solução legal
Lilian Gomes defendeu um
trecho do Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010)
que acabou sendo retirado quando a proposta original foi analisada na
Câmara dos Deputados. Ela disse que, se não tivesse sido suprimido, o trecho
asseguraria vários direitos que agora estão em discussão no Supremo Tribunal
Federal, que está julgando ação apresentada pelo DEM questionando a
inconstitucionalidade do Decreto 4.887. A pesquisadora se referia a um
capítulo que tinha o título “Do direito dos remanescentes das comunidades dos
quilombos às suas terras”. Nele, um artigo estabelecia que “o direito à
propriedade definitiva das terras ocupadas pelos remanescentes das comunidades
dos quilombos, assegurado pelo art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias da Constituição Federal, se exerce de acordo com o disposto nesta
Lei”. Também continha um parágrafo afirmando que “consideram-se remanescentes
das comunidades dos quilombos, para os fins desta lei, os grupos
etnicorraciais, segundo critérios de autodefinição, com trajetória histórica
própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de
ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica
sofrida”.
– Estão aí os elementos
do grande temor daqueles que querem restringir os direitos quilombolas, como a
luta contra o racismo e o direito coletivo à terra, entre outras questões –
declarou ela.
Autor do projeto que deu
origem ao Estatuto da Igualdade Racial, o senador Paulo Paim (PT-RS),
presidente da CDH, afirmou que vai propor a reinclusão desse trecho no
estatuto.
Agência Senado
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