Há algumas semanas foi publicado um estudo da
Consultoria do Senado Federal a respeito de supostos custos que a Zona Franca
de Manaus (ZFM) geraria ao país, comentado aqui pelo jornalista Ribamar
Oliveira. Trazia o incendiários argumentos de que a Zona Franca gera
muitos custos ao país, deveria ter prazo limitado e é subsidiada por perdas nos
demais municípios e estados brasileiros. É importante notar que este não
é um estudo científico; artigos científicos estão sujeitos a revisão por
pares, processo no qual o trabalho se sujeita ao escrutínio de
especialistas. O autor, da consultoria do Senado Federal, não esteve
sujeito a revisão. Seguem comentários que qualquer revisor teria feito ao
trabalho. O primeiro argumento se baseia no fato de que o IPI (Imposto sobre Produtos
Industrializados), após arrecadado, seria distribuído dentre todas as unidades
da Federação. Dado que a ZFM não paga IPI, estaria subtraindo tais
valores de todos os cidadãos. Este argumento é falho. Incentivos de
redução de alíquota não são gastos. Como exemplo, o IPI de motocicletas é
de 35%. Ou seja, caso alguma empresa escolha produzir motocicletas fora
da Zona Franca, teria de pagar 35% de imposto; caso produza em Manaus, não paga
IPI. Dado o faturamento em 2012 de cerca de R$14 bilhões com o polo de
duas rodas em Manaus, o autor argumenta que o resto do Brasil está “pagando” de
incentivos de IPI R$5 bilhões. No caso hipotético de ter de pagar R$5
bilhões, é pouco provável que essas indústrias de duas rodas produziriam no
Brasil ou mesmo que o número de motocicletas vendidas seria elevado. Este mesmo
argumento vale para o setor automobilístico de São Bernardo do Campo (com IPI
muito inferior), ao setor de eletrodomésticos do Paraná, Minas Gerais e São
Paulo, dentre outros que tiveram o IPI reduzido ou eliminado em 2012.
Outro caso foi a indústria de informática, que para nascer no Brasil precisou
da Lei de Informática; coincidentemente, esta lei muito se assemelha à lei da
ZFM. Entretanto, não se vê argumentos de que precisamos descontinuar em
breve os incentivos da Lei de Informática; pelo contrário, a Presidente Dilma
recentemente aprofundou os incentivos retirando o PIS/COFINS de tablets.
Há muitos casos semelhantes espalhados por todo o Brasil: grandes indústrias
nacionais como EMBRAER não pagam quase nada de impostos e ainda são
constantemente subsidiadas através de gastos públicos, desde empréstimos do
BNDES, isenção de IPI e PIS/COFINS, à sustentação do ITA para gerar mão-de-obra,
investimentos que faremos a perder de vista (sem prazo). Portanto, o
argumento do autor de que todo tipo de incentivo só deveria ser válido por
tempo limitado não se sustenta. Se válido, inviabilizaria todos os casos
mencionados além da ZFM. O estudo ainda argumenta que uma das fragilidades da Zona Franca é gerar poucos
empregos com baixa remuneração. O autor esquece que a redução de
mão-de-obra no segmento industrial é um fenômeno observado no mundo todo ao
longo dos últimos 100 anos. Isto não é privilégio de Manaus; todas as
cidades industriais do mundo (e São Paulo com destaque) têm este desafio.
Ele é imposto por um mundo globalizado onde, para competir, indústrias precisam
ser cada vez mais produtivas. O fato de a ZFM conseguir grande produtividade
com pouco volume de empregados ou salários (5,7% do faturamento industrial é
gasto com salários) deveria ser considerado testamento de sua competitividade e
sustentabilidade, e não o contrário. Há outros pontos problemáticos com o
estudo: há, por exemplo, um erro matemático de importância. O autor
afirma que o Governo Federal estima arrecadar na região norte R$14 bilhões em
2013, o que seria menos que o total de isenções fiscais estimado em R$22
bilhões (neste caso para a região toda e não apenas Manaus). Em consulta
no site da Receita Federal, nos últimos 12 meses findos em fevereiro de 2013 a arrecadação no
Amazonas apenas foi de R$10 bilhões sem contar com a arrecadação previdenciária
que é de magnitude semelhante. O Amazonas tem menos de 20% da população
da região, menos de metade do PIB. Um erro claro de estimativa,
provavelmente não intencional, certamente danoso. Além das deficiências do argumento, há itens adicionais a lembrar: o Amazonas
tem hoje 98% de seu território conservado em floresta tropical de pé.
Nenhum outro estado brasileiro, a exceção do Amapá, pode afirmar o mesmo.
E não é porque o Amazonas ama a floresta mais que outros. Pode-se mostrar
(através de artigos científicos revisados por pares) a forte ligação econométrica
do desenvolvimento da ZFM com a redução das taxas de desmatamento no
Amazonas. O Brasil tem escolhas a fazer; a Zona Franca de Manaus é das
melhores.
Denis Benchimol Minev é economista, mestre pela Universidade Stanford e Wharton e ex-Secretário de Planejamento e Desenvolvimento Econômico do Grande Estado das Amazonas.
E-mail: denis.minev@gmail.com
Denis Benchimol Minev é economista, mestre pela Universidade Stanford e Wharton e ex-Secretário de Planejamento e Desenvolvimento Econômico do Grande Estado das Amazonas.
E-mail: denis.minev@gmail.com
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