Sarney foi o personagem da semana novamente, após encontro com um dos mais respeitados jornalistas do Amapá, Luiz Melo, que foi a Brasília com o ex-presidente do país e que cumpre seu terceiro mandato de senador pelo Amapá. Foi aproximadamente uma hora de gravação, levada ao ar no rádio na última sexta-feira, durante o programa Luiz Melo Entrevista, pela rádio Diário FM. O jornal Diário do Amapá publica a seguir uma síntese da conversa entre ambos, um resumo sobre os principais trechos. Sarney reage a críticas bem ao seu estilo, equilibrado, mas pragmático. Porém acaba frustrando quem imaginava que pudesse fazer o anúncio de uma das decisões mais aguardadas no meio político local, que é se vai tentar nova reeleição pelo Amapá.
Diário do Amapá – Por questões ideológicas ou meramente políticas, quem sabe, Lula e Sarney, Sarney e Lula antes sempre estiveram em caminhos opostos e hoje são amigos, até ocupam o mesmo palanque político. Quem cortejou quem?
José Sarney – Quando o Lula foi candidato a primeira vez o Zé Dirceu me procurou dizendo que era um momento novo no Brasil e a República completava 100 anos, enfim, era uma grande mudança e ele atribuía exatamente à minha presidência. Foi possível um operário ser candidato à Presidência da República, em 1989, quando eu era presidente. E quase chegou à Presidência. Então ele sabendo da minha incompatibilidade com o José Serra me procurou juntamente com o Alencar, que era meu amigo, meu companheiro de Senado, ficou me cortejando para que pudesse apoia-lo.
Diário – Partiu dele, então?
Sarney – Sim, além do Zé Dirceu e o Alencar o próprio Lula esteve aqui em minha casa para apoiá-lo. Eu então disse que o apoiaria, sobretudo porque achava que para a minha carreira política era muito gratificante que eu tendo sido presidente e ao mesmo tempo tendo feito a redemocratização do Brasil chegássemos aos 100 anos da República com uma representação de todas as classes no poder no Brasil, afinal começamos a República com os militares, depois fomos para os barões do café, depois os bacharéis, para os republicanos históricos, enfim, depois os militares retomaram o poder em 64 e quando assumi a presidência completamos os 100 anos, com a oportunidade de termos um operário no poder.
Diário – Seu papel foi fazer um ajuntamento de forças?
Sarney – Sim, sobretudo porque eu não representava algo ideológico, sempre fui um homem de centro, sobretudo porque a ideologia já tinha caído desde a queda do muro de Berlim. Então eu não aderi ao Lula, o Lula foi que veio pedir o meu apoio. Eu nunca aderi a governo algum, todos vieram pedir o meu apoio. Fernando Henrique também. Não apoiei abertamente no primeiro mandato dele, mas no segundo sim e somos amigos até hoje. Eu tenho uma boa convivência na política, nunca tive inimigos políticos, tive adversários.
Diário – O senhor nunca responde a quem o ataca, não atira nessas pessoas. Por que presidente, questão de sabedoria?
Sarney – Não, eu acho que grande parte das coisas que são ditas contra mim são insultos, eu não respondo a insultos. Quando são fatos eu tenho o direito de responder. Por outro lado, como sou cristão, sou um homem de fé, acredito que Deus pede à gente que perdoe os inimigos. Eu tenho a satisfação de dizer que vou fazer 60 anos no Congresso Nacional e já assisti muitas comissões de inquérito, muitos escândalos e nunca meu nome foi envolvido em escândalo nenhum, que participasse de alguma coisa, sempre fui muito respeitado.
Diário – Essa relação respeitosa com Lula continua com Dilma?
Sarney – Continua. Eu conheci Dilma no governo do Lula, não a conhecia antes. A conheci como ministra e passei a admira-la pelo que realizou no Ministério das Minas e Energia, sempre tive muito contato com ela como presidente do Congresso e verifiquei que era uma mulher com grande capacidade administrativa, de gestão e de conhecimento dos problemas, com uma visão nacional, então também passei a ser amigo da Dilma.
Diário – Tem caído a popularidade dela segundo pesquisas. Preocupa?
Sarney – As pesquisas refletem determinados momentos que se está vivendo. Agora estamos vivendo uma porção de problemas, como a questão da Petrobras, então evidentemente que o governo sofre nesse momento, mas o que pesa mesmo é o conjunto de obras que ela conseguiu realizar, que é uma continuidade do governo do Lula, sobretudo os avanços no social.
Diário – Como o Minha Casa Minha Vida, seria essa a vitrine do governo Dilma?
Sarney – Eu acho que a marca dela é, sobretudo, a marca do social, a distribuição da renda e o esforço para a parte da saúde que tem sido feito, além da parte da infraestrutura, a projeção do Brasil, a economia tem se desenvolvido bem. O Brasil hoje tem uma das maiores reservas do mundo. Quando fui presidente nossas reservas eram de U$ 9 bilhões de dólares e hoje são de U$ 390 bilhões de dólares, então a gente verifica o quanto o Brasil avançou.
Diário – A Copa do Mundo que já está aí na porta faz tão mal assim para o Brasil como pregam os mais aloprados?
Sarney – Não acho que foi uma vitória que o Brasil conquistou, era um sonho de todos os brasileiros. Transformaram isso em um acerta coisa política porque a Fifa resolveu interferir muito, como resolver fazer o campeonato em 12 cidades, quando na realidade poderia concentrar em 6 cidades, o que significava gastos muito menores e qualidade muito maior.
Diário – Por que o Brasil continua tão doente e com a corrupção assombrando todo mundo?
Sarney – Olha a corrupção é quase impossível de extirpar, ela faz parte da conduta humana. O que se deve fazer é uma profilaxia, quer dizer tomar vacina para que ela não possa existir.
Diário – Quer dizer que já nascemos corruptos?
Sarney – Não, é que faz parte da natureza humana, assim como o homem também é violento, então se ele pode fazer as coisas por um caminho mais curto ele faz. A luta da humanidade foi sempre essa, tanto é que o primeiro documento que existe sobre democracia no mundo é o discurso do Péricles aos mortos da Guerra do Peloponeso, em que pela primeira vez fala no autogoverno, que é o governo das cidades, ou seja, os países sendo governados pela escolha dos cidadãos. Então nesse discurso ele fala dos seus inimigos, que tinham roubado o ouro da estátua que iam fazer de Fídias. Então ficou associado as ideias politicas do mundo ocidental a corrupção ligada a isso, então passou a ser uma estratégia de ataques a adversários atribuir a prática de corrupção.
Diário – O que se vê até hoje, não é?
Sarney – Sim especialmente com o advento da internet, das redes sociais, quando todo mundo pode pegar seu Ipad no quarto e falar o que quiser. Então dá a impressão nacional de que a corrupção aumentou desenfreadamente. O que houve foi uma divulgação maior da corrupção.
Diário – Nesse tempo todo de mandatos consecutivos pelo Amapá para uns o senhor já fez muita coisa pelo Estado, mas outros, principalmente seus adversários políticos, dizem que poderia ter feito muito mais pelo que significa Sarney, um dos homens mais poderosos da República. A consciência do senhor, presidente, o que diz?
Sarney – Olha, acho que esses que dizem que eu podia ter feito muito mais eles nunca fizeram nada. Vai ver é perguntar ‘e você o que fez?’ Eles em geral não colocaram um prego numa barra de sabão pelo Amapá... [risos] Eu nunca fui Executivo no Amapá, eu nunca indiquei um secretário, nunca ninguém viu o meu nome envolvido em qualquer coisa que existisse no Amapá. Eu cheguei no Amapá e tenho dado um exemplo de uma conduta correta, de um político correto e de um homem que não tem procurado dividir ou ofender ninguém, perseguir ninguém, nunca procurei denegrir ninguém e tem siso essa minha conduta esse tempo todo.
Diario – E o senhor já tomou a decisão de se candidatar novamente a uma nova eleição?
Sarney – Sinceramente, não. Isso vai depender de como eu estiver fisicamente para ter um desempenho como eu costumo atuar. Mas dentro dos próximos 30 ou 60 dias devo fazer este anúncio, sim.
Perfil...
Entrevistado. José de Ribamar Sarney Costa tem 84 anos de idade, é advogado, jornalista e escritor. Começou a vida política ainda estudante do Colégio Liceu, em São Luís (MA), tendo depois chegado a suplente de deputado federal, até vencer uma eleição para a Câmara Federal e depois elegeu-se governador do Maranhão e depois senador. Nos anos 1980 engajou-se na campanha pelas eleições diretas e pouco depois compôs como vice a chapa vitoriosa do Presidente Tancredo Neves, que faleceu antes da posse. Sarney assumiu as rédeas do País e conduziu o período da redemocratização, da Constituinte e da volta das eleições diretas para Presidente. Depois foi eleito senador pelo Amapá e está no terceiro mandato.
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