O excelente Blog português Mitos Climáticos publicou na íntegra entrevista com o Prof. Delgado Domingos à revista Climatização, de Setembro/Outubro de 2009, e conduzida por Rita Ascenso. Delgado Domingos, um especialista conceituado internacionalmente e com provas dadas ao longo de toda a sua atividade científica com destaque para a área das alterações climáticas, energia, ambiente... É desde Dezembro de 2008 presidente do Conselho de Administração da Lisboa E-Nova. Para este professor catedrático, há quem considere contraditórias as suas posições no que se refere às alterações climáticas, Quioto... com as metas da E-NOVA. Conheça os argumentos deste investigador e decisor que defende que “o aquecimento global se transformou para muitos numa questão político-ideológica de que se recita o catecismo” e para quem “as ameaças de catastrófico aquecimento global com que somos diariamente bombardeados não têm sustentabilidade científica e caminham para o descrédito, face à realidade concreta”. E ainda a sua visão sobre as questões energéticas e ambientais, a climatização nos edifícios, o projecto, as cidades e o urbanismo... Confiram a entrevista...
É já uma “bandeira” sua defender que não existe aquecimento global da forma como ele é apresentado mundialmente... Ou seja, para si o termo aquecimento global é infeliz?
O modo como as minhas afirmações têm sido interpretadas no que se refere às Alterações Climáticas, ao Protocolo de Quioto, ao Pacto dos Autarcas, etc. leva alguns a afirmar que são contraditórias com as metas e as medidas propostas na Estratégia Energético Ambiental para Lisboa que a CML aprovou e o Presidente já tinha anunciado publicamente em Maio de 2008.Como principal responsável pela estratégia e pelas medidas propostas pela Agência Municipal de Energia e Ambiente da CML (Lisboa E-Nova) e na qualidade de Presidente do seu CA já por várias vezes e para diferentes audiências, nomeadamente através da minha página na internet e do blog do Público, De Rerum Natura, tive oportunidade de documentar a fundamentação e justificar as propostas.Com seriedade e fundamentação nunca os vi pôr em causa. Em contrapartida, as reacções difusas que me chegam apenas mostram como o aquecimento global se transformou para muitos numa questão político-ideológica de que se recita o catecismo.A CML, ao aprovar a Estratégia Energético Ambiental para Lisboa e ao adoptá-la como um dos instrumentos estruturantes a ter sempre em conta, antecipou e ultrapassou em compromissos concretos e calendarizados todos os municípios nacionais e a maioria dos europeus que assinaram o Pacto dos Autarcas.Significativamente, os organizadores da declaração conjunta dos municípios portugueses que subscreveram o Pacto dos Autarcas não aceitaram a correcção proposta pela Lisboa E-Nova que se limitava a juntar aos potenciais efeitos das alterações climáticas provocadas pela emissão de gases com efeito de estufa (GEE) o agravamento dos efeitos da variabilidade natural.A diferença marcante entre uma e outra posição é que uma responsabiliza e compromete os actuais autarcas a combater e prevenir os efeitos da natural variabilidade climática que se exprimem, entre muitos outros, nas recorrentes cheias e inundações, nos deslizamentos de terras, nas ondas de calor e de frio, cujo agravamento, em danos sociais e económicos, é consequência directa da imprevidência ou da incompetência, tão do agrado da ganância especulativa que tem campeado no ordenamento do território e nos PDM.Atribuir todos estes efeitos aos malefícios do aquecimento global provocado pelas emissões de GEE, poderá ajudar a mobilizar a opinião pública para os desafios do futuro, o que é bom, mas seria muito melhor se assumisse também a sua responsabilidade concreta e demonstrasse sinceridade de propósitos, combatendo-os desde já com todo o empenho e determinação.Preocupando-me com o futuro e com o rigor da fundamentação científica do que se afirma, discordo naturalmente do termo aquecimento global e prefiro alterações climáticas como o próprio IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change) faz.Os alarmistas climáticos, nomeadamente Al Gore, têm baseado a sua militância nos efeitos do aquecimento global e entram numa confusa dialéctica para justificar o facto de não ter havido aumento das temperaturas médias globais nos últimos 10 anos, (nem nos continentes nem nos oceanos) apesar das crescentes emissões de CO2 e GEE para a atmosfera.Existe sim variabilidade climática e potenciais alterações climáticas, que tanto podem ser de aquecimento como de arrefecimento. Quem se preocupa com o rigor científico e os factos incontroversos não elabora uma estratégia com enormes impactos sociais e económicos tendo por base emotivas reacções conjunturais, tal como não confunde causas com efeitos.Para mim, como já várias vezes afirmei e fundamentei, o cerne da questão encontra-se na utilização desbragada de combustíveis fósseis, cujas reservas se aproximam do esgotamento, para além dos terríveis efeitos na saúde humana e nos ecossistemas, dos poluentes produzidos na sua queima (nesta perspectiva, o CO2 não é um poluente).É por isso que reduzir a utilização dos combustíveis fósseis e promover as energias renováveis em todas as suas formas é fundamental. Mas mais importante ainda é promover a eficiência energética em todas as suas vertentes, de entre as quais importa realçar a organização espacial das actividades, a edificação, o urbanismo, e as suas consequências no clima urbano, na saúde e na qualidade do ambiente.Em muitos objectivos concretos, a minha posição e a dos “Militantes do Alegado Aquecimento Global” (MAAG) é semelhante, mas difere radicalmente em muitos aspectos da sua fundamentação, bem como nos caminhos propostos para os alcançar. Por um lado, o CO2 e os GEE são para mim um efeito e um indicador ambiental muito importante, mas não a causa determinante como defendem os MAAG. Para estes, a captura e sequestro do CO2 (CCS) e a energia nuclear são defendidas como soluções tecnológicas para controlo do aquecimento global.Ora, o carvão é e será ainda por muitos anos a fonte de energia mais importante para a produção de electricidade, pois tem reservas provadas e geograficamente distribuídas para algumas centenas de anos. É uma importante fonte de poluição, sobretudo a nível local, que é possível reduzir drasticamente com tecnologias conhecidas e comprovadas.Transformá-lo no principal inimigo a abater, como os radicais do MAAG têm feito, advogando, nomeadamente, a desobediência civil para o conseguir, como faz e tem patrocinado o guru inspirador James Hansen é lamentável, não só porque desvaloriza todos os poluentes graves face ao CO2 (que não é um poluente) como inviabiliza a utilização e desenvolvimento da enorme panóplia de tecnologias viáveis que tornam carvão cada vez mais limpo. O gigantesco desperdício de recursos dedicados à miragem tecnológica do CCS que os MAAG provocaram seria muito mais bem utilizado na reflorestação e na protecção dos ecossistemas.Uma das outras implicações, em termos de transporte urbano é o favorecimento governamental, entre nós, dos motores diesel, em detrimento dos motores a gás natural ou GPL, esquecendo o grave problema ambiental das emissões de partículas, NOx, etc pelos motores diesel, problema que não existe nos motores a GNL ou GPL, embora possam emitir um pouco mais de CO2. Obcecados com o CO2 e os GEE, os MAAG tendem a ignorar completamente os efeitos das reais alterações climáticas locais e os efeitos locais e globais das alterações no uso do solo. Estreitamente ligada aos MAAG está o mercado do carbono e os colossais interesses financeiros e políticos que movimenta.Criar a ideia, como tem sido feito, de que as ameaças climáticas do futuro se devem sobretudo às emissões de GEE é manipulatório e acompanhado das manifestações típicas de uma ideologia. Pode ter tido o mérito de consciencializar a população em geral para as graves consequências do esbanjamento de recursos naturais não renováveis e para as terríveis ameaças ao ambiente e à nossa sobrevivência se não arrepiarmos caminho mas, em contrapartida, pode desviar as atenções e os recursos económicos para a solução de problemas menores ou simplesmente não problemas.Em meu entender, as ameaças de catastrófico aquecimento global com que somos diariamente bombardeados não têm sustentabilidade científica e caminham para o descrédito, face à realidade concreta. A perda de credibilidade científica tem efeitos devastadores, sobretudo numa altura de radical alteração de modelos económicos e em que a objectividade e o rigor da Ciência são imprescindíveis para antever as consequências das possíveis alternativas que se oferecem.
Mas os dados e as projecções apontam para esse aquecimento...
Ainda bem que falou em “projecções” que é algo muito diferente de previsões. Eu estou à vontade para poder dizer isso porque há mais de 40 anos que pratico a ciência computacional que está na base dos modelos climáticos invocados para explicar situações passadas e fazer projecções para o futuro. Em Portugal fui o primeiro a implementar e divulgar, a nível universitário, a previsão meteorológica diária para o nosso país e a confrontar sistematicamente as previsões com as observações.Conheço por isso muito bem e utilizo diariamente o tipo de modelos e métodos que sustentam as afirmações de anunciadas catástrofes. Estas não se baseiam em previsões, como aquelas que diariamente fazemos em meteorologia e que são tipicamente boas até aos 10~15 dias seguintes... mas fracassam miseravelmente quando se pretende prever a próxima estação.A ideia prevalecente em certos meios é que se este tipo de previsões for efectuado para décadas ou séculos, utilizando vários modelos semelhantes, a média dos resultados dará uma ideia do que irá suceder dentro de algumas décadas ou séculos. Há razões fundamentais de natureza física e computacional para considerar que, com o conhecimento científico actual e os meios de cálculo disponíveis, não se possam fazer tais tipos de previsões e nelas basear decisões políticas com enormes consequências económicas e sociais.Não sendo possível chamar-lhe previsões, os praticantes destas metodologias passaram a chamar-lhes projecções. Estas não são mais do que visões subjectivas baseadas na extrapolação de representações simplificadas e muitas vezes distorcidas da realidade concreta. Projecções e cenários são instrumentos úteis para ganhar sensibilidade a certos factores, como se de jogos de guerra ou de gestão se tratasse. Mas são apenas isso. Quando se convertem em instrumentos de manipulação da opinião pública podem tornar-se extremamente nocivos e dispendiosos.Nesta perspectiva, é importante recordar dois exemplos. Em 1988, numa audição no Congresso dos EUA, o famoso guru dos MAAG, James Hansen, afirmou que, se não fossem drasticamente reduzidas as emissões de GEE, no prazo de 20 anos teríamos graves desastres climáticos. Passados os 20 anos, o que se constatou foi que embora as emissões de GEE tivessem ultrapassado as do cenário, houve um ligeiro aumento de temperatura (menos de 0.5 ºC) com tendência para descer e o prometido desastre não se concretizou. O autor da profecia justificou o fracasso com o efeito dos aerossóis, que tinha manipulado subjectivamente para que as previsões não divergissem do observado em anos anteriores.A metodologia usada para anunciar catástrofes em 2050 ou 2100 se a utilização do carvão não for banida, é semelhante, mas 40 ou 90 anos é suficientemente distante para que os seus autores ainda existam e prestem contas pelos estragos que causaram.No período que imediatamente antecedeu a Guerra do Iraque, a maioria da opinião pública mundial foi convencida de que o Iraque possuía armas de destruição massiva. Tony Blair afirmou mesmo que tais armas poderiam ser activadas em poucas horas e Durão Barroso, primeiro-ministro português, informou também ter visto as provas da sua existência. Tais armas não existiam, como hoje sabemos!
Então a preocupação com os desastres climáticos não faz sentido do seu ponto de vista?
Claro que faz todo o sentido se colocada na perspectiva correcta que é ter em conta a variabilidade climática natural e tomar as medidas que, não só impedem o agravamento dos efeitos, como os minimizam. O desastre de Nova Orleães, nos Estados Unidos, provocado pelo furacão Katrina era previsível, era anunciado e sabia-se que um dia iria acontecer, tal como se sabe que iremos ter cheias e inundações como sempre tivemos.As chuvas de 1967 em Lisboa eram inevitáveis, mas as cheias e desastres que provocaram podiam ter sido evitados, se tivessem sido tomadas as medidas que impedissem a impermeabilização dos solos, as urbanizações em leitos de cheia, etc. e se tivessem alocado os recursos necessários para prevenir os efeitos de fenómenos climáticos menos frequentes, mas naturais e inevitáveis. Estes desastres devem-se à imprevidência e à incúria e não ao alegado aquecimento global.Outra questão é a sobreposição de alterações climáticas provocadas pela acção humana que agravam as variabilidades naturais. É aqui que surgem as emissões de CO2 (e GEE) que provocam um aumento de temperatura. O CO2, ele próprio, não é o principal gás que provoca este efeito, mas sim o vapor de água. O CO2 aumenta a temperatura à superfície da Terra e esse é um facto bem conhecido da Física há muitos anos. Este aumento de temperatura provoca o aumento da evaporação, e é esse acréscimo de vapor de água que multiplica o efeito do CO2.Falta apenas um pormenor, habitualmente omitido pelos MAAG e que resulta de o vapor de água originar as nuvens. A formação e o comportamento das nuvens são fenómenos cruciais com muitos aspectos pouco conhecidos e mal dominados, pois as nuvens tanto podem provocar aquecimento como arrefecimento, consoante o seu tipo e a altitude a que se formam. Por este motivo, as nuvens podem constituir um regulador da temperatura à superfície.
Clique aqui e aqui para conferir, respectivamente, a primeira e a segunda partes completas da entrevista.
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