sexta-feira, 19 de março de 2010

José Sarney

Março das Bodas de Prata

De 15 de março de 1985, o meu sentimento é de dupla face. Numa, a volta da democracia ao País; na outra, a dor profunda do martírio de Tancredo Neves. A história o preparara para fazer a transição democrática e inaugurar aquilo que ele mesmo batizou como slogan de sua campanha: a Nova República. Costumamos dividir os nossos períodos históricos em Colônia, Império, República — que nasceu de um golpe militar, por isso mesmo batizada por Aristides Lobo de “sem povo”. A República foi marcada pelas dores de seu gesto inaugural: divisão militar e instabilidade política, com o medo da volta da monarquia. Por não ter suporte popular foi obrigada a usar do voto a descoberto, invenção de Campos Sales — eleição a bico de pena, mandatos ilegítimos, embora representação legítima, como dizia Gilberto Amado. É a época das intervenções, da degola dos parlamentares não alinhados e dos carcomidos, como eram chamadas as velhas oligarquias provincianas pelos tenentes. A esse período chamam os historiadores de República Velha. Ela termina com a Revolução de 30, que começou em 22 com a Revolta dos Tenentes, repicada em 1924 e desaguada em 1930. Depois é a ditadura, o Estado Novo. Renasce em 1946 a República, efemeramente chamada de Nova República, nome logo esquecido porque só a marcará sua desintegração. Vem 1954 com o suicídio de Vargas, o 11 de novembro de 1955, a meteórica e exótica experiência parlamentarista e seu fim em 1964 com o regime dos generais. Em 1985 volta a democracia, e a República, uma vez mais, é batizada de Nova República. Esta realmente marcou a história do Brasil e hoje está definitivamente incorporada a nossa vida institucional. Não porque as instituições voltaram, mas porque ela trouxe marcos novos e definitivos, que foram a entrada em nossos objetivos políticos dos direito sociais. A Nova República sepulta as ideologias e a discriminação sobre elas. Saímos da hegemonia da preocupação econômica para uma democracia social. A convocação da Constituinte, feita por mim, já apontava o caminho dos direitos sociais. A sociedade democrática, num sistema de capilaridade, emergiu como a verdadeira cidadania com todos seus direitos. O lema do governo já revelava a característica da Nova República: Tudo pelo Social. Este o segredo dos 25 anos de paz social, de alternância do poder, da presença do proletariado nas decisões nacionais. Quando agora se falar de divisão da história, dir-se-á que foi a Nova República que mudou o Brasil, não somente com a liberdade e as instituições, mas com os direitos sociais. Comemoremos.

José Sarney foi governador, deputado e senador pelo Maranhão, presidente da República, senador do Amapá por três mandatos consecutivos, presidente do Senado Federal por três vezes. Tudo isso, sempre eleito. São 55 anos de vida pública. É também acadêmico da Academia Brasileira de Letras (desde 1981) e da Academia das Ciências de Lisboa

jose-sarney@uol.com.br

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