Não poderemos admitir qualquer tipo de ação, pública ou privada, que se intitule de desenvolvimento, se não forem requisitos básicos a opinião e a decisão democráticas, o interesse coletivo, o acesso igualitário à riqueza, a justiça social, a preservação ambiental e a igualdade entre os povos. O atual modelo de desenvolvimento se mostrou falido em todos esses critérios. Toma caminho oposto em todos eles, colocando em risco a sobrevivência da humanidade pelo aniquilamento do planeta num tempo bastante curto.
Na Amazônia, particularmente, predominam regras medievais com uma roupagem rota de modernidade. Exploração predatória, desflorestamento sem controle, trabalho escravo, tráfico de mulheres e crianças para exploração sexual, abuso de poder político e econômico que afetam a democracia e ausência do Estado são apenas alguns aspectos desse modelo com os quais milhões de pessoas são obrigadas a conviver diariamente.
Mundo afora, se assemelham as ações predatórias que destroem o meio ambiente, colocam povos em conflito, empurram milhões de pessoas para a miséria. Mais recentemente, a “crise” financeira mundial, resultado de um mercado especulativo e insustentável, deixa outros milhões de pessoas em situação de insegurança, atingindo diretamente seus direitos essenciais, como alimentação, moradia e emprego, ao mesmo tempo em que serve para enriquecer alguns poucos indivíduos ou grupos econômicos, ágeis na mudança de métodos e de argumentos para convencer sobre um modelo mais moderno para a prosperidade do mundo.
Os avanços tecnológicos – válidos, necessários, corretos – contrastam com a fome e a miséria. Se, recentemente, melhorou o acesso à água potável no mundo – 87% da população mundial, segundo a Organização Mundia da Saúde – a escassez é iminente pelo absoluto mau uso, pela concentração desse bem natural e pela busca do lucro.
Nos desafiamos, na Comissão da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional, a estreitar as relações com os centros produtores de conhecimento, ciência e tecnologia. Junto com o viés ideológico, a democratização do acesso e das decisões sobre a aplicação tecnológica darão outro destino à humanidade, diferente do rumo que, sistematicamente, tem-se adotado, com agravamento desde a Revolução Industrial e, mais recentemente, com a chamada “globalização”.
As crises cíclicas do capitalismo são resultado da autofagia do sistema. São, por isso, apenas parte do problema. A gravidade está no próprio modelo predatório e autofágico de “produção de riqueza e desenvolvimento”.
As ações do passado, sejam do poder público, sejam da iniciativa privada, tomadas em outra situação e outra conjuntura, não podem servir de justificativa para repetir modelos que não estão mais adequados – nem estavam à época – a uma realidade em que a sobrevivência da humanidade e a igualdade de direitos e acessos deve ser prioritária, sobrepondo-se à exploração predatória e irracional e ao lucro fácil de alguns que deixam atrás de si um rastro de destruição e miséria. A Amazônia, soberanamente brasileira e das nações latino-americanas, especialmente, deve ser o espaço para o novo modelo, de harmonia entre homens e da humanidade com a natureza. Todo o globo deve ter esse compromisso, principalmente a partir das ações locais que visem reduzir a pressão sobre a floresta, e com o desenvolvimento e a transferência de recursos tecnológicos e e financeiros que nos permitam o uso melhor adequado das potencialidades da floresta, mantendo-a em pé para a nossa e as futuras gerações.
*Janete Capiberibe foi exilada política durante a ditadura militar, vereadora na redemocratização, deputada estadual constituinte e secretária da indústria, comércio e turismo do Amapá. É deputada federal pelo PSB do Amapá e presidenta da Comissão da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional.
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