O vulcão Eyjafjallajokul
Todos vivemos a era da interdependência, cuja síntese mais visível é a globalização. Tudo que acontece aqui ou acolá, mexe com aquilo, cá e lá. Há pouco falava-se mais na economia que, guiada por computadores girando dia e noite ao redor do mundo, determinava os mercados, contaminava-os e provocava a economia de um mundo só. A última face visível foi o dominó que começou com a quebra do Lehman Brothers e levou a uma das maiores crises econômicas, de que ainda não se recuperou a Europa, mergulhada na recessão e no desemprego.
As cinzas do Eyjafjallajokul levantaram-se a onze quilômetros de altura e moveram-se lentamente pelos céus nórdicos e depois passearam por todo o espaço aéreo europeu. Resultados: mais de 100.000 vôos cancelados em seis dias, afetando 1,2 milhão de passageiros, um caos aéreo que invadia aeroportos vazios e logo se comungava a gares superlotadas, ônibus insuficientes e a economia atingida pela suspensão do turismo e a interrupção do fluxo de mercadorias nobres transportadas por via aérea, paralisando indústrias sensíveis.
Tudo isso pelas cinzas de um vulcão. Eles jogavam a milhões de anos esses detritos na atmosfera e não acontecia nada. O próprio vulcão islandês há 190 anos já fizera uma dessas e o Krakatoa, entre Sumatra e Java em 1883 cobriu o mundo durante meses e, como não tínhamos aviões, esse caos não existiu.
É um fato novo o nível de interação entre a natureza e a vida cotidiana que ocorreu com as cinzas que viajaram da Islândia. Escondida no frio do extremo norte e só notada por ter quebrado com a crise financeira, ela reagiu com suas cinzas, ameaçando os motores dos aviões com partículas vindas do fundo da terra, depois de, na explosão inicial, ter formado durante horas o terceiro rio do mundo, com o volume das águas do degelo da larga calota que cobria o vulcão. Nós, brasileiros, acostumados com nosso calor suarento, sempre louvamos termos sido preservados por Deus dos violentos fenômenos da natureza: vulcões, furacões, terremotos — mas não nos livramos das secas nem das enchentes. E a miscigenação nos deu a mulata!
A previsão de crescimento da Europa para este ano era de 0.5 a 1,5%. Agora os analistas acham que as nuvens do Eyjafjallajokul podem engolir estas pífias esperanças.
A culpa está sendo dividida com os controladores de vôos que exageraram nas medidas de segurança. O corredor Niki Lauda, hoje dono de uma companhia aérea, acostumado ao perigo das pistas, pilotando um dos seus aviões, entrou na nuvem de cinzas e voltou dizendo que “foi meu vôo mais bonito”. As nuvens eram bonitas, mas os resultados foram feios.
José Sarney foi governador, deputado e senador pelo Maranhão, presidente da República, senador do Amapá por três mandatos consecutivos, presidente do Senado Federal por três vezes. Tudo isso, sempre eleito. São 55 anos de vida pública. É também acadêmico da Academia Brasileira de Letras (desde 1981) e da Academia das Ciências de Lisboa
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