O velho
Estive num importante evento em comemoração aos sete anos do programa "Rural Sertanejo", apresentado pelo Desembargador Gilberto Pinheiro. Antes de adentrar no concorrido ambiente festivo, o Espaço Cultural Tony Tavares, em frente à rádio 102 FM, afastei-me um pouco para olhar o grande rio mar, com sua ondas revoltas, enfeitadas por canaranas, buritis e buçus, que se desmanchavam em espuma ao bater na grande barreira de concreto. Minha vista sumiu com as águas passando a grande fortaleza, em busca do mar. Lembrei-me de Lisboa, quando por lá estive, e de um velho português que da Torre de Belém, apontava para o mar aberto dizendo: - daqui saiam as caravelas para o mar. Ao descer as escadas vi réplica de naus que desbravaram os mares e descobriram mundos novos. Um cesto no alto do mastro, o famoso "caralho", foi objeto de outra crônica. Voltei à realidade e entrei no alegre ambiente, e logo vi, com um livro entre as mãos, o Dr. Rui Guilherme, que me presenteou com sua mais recente obra, "O Velho", que li com grande satisfação. Aventuro-me a falar um pouco da obra, tanto por ser um admirador dos homens das letras, quanto pelo estilo ímpar do escritor Rui Guilherme narrar sem pieguice ou crueza as vissicitudes da vida. Logo no início, um belo poema fala sobre a solidão e o amor capaz de preencher e completar um universo particular, buscado ao longo da vida. Essa aparente introspecção e profunda causa do destino por ventura traçado para o ser humano, a solidão preenchida pelo amor, que introduz a perspectiva de que o livro nos conduzirá ao complexo psicológico dos dissabores da vida, é quebrado ao sequenciamento da leitura. Digo isso porque os contos possuem um envolvente enredo sobre encontros e desencontros, família, amizade, crenças e aspectos da nossa cultura cabocla mesclada ao refinamento dos homens estudados e apreciadores das boas coisas da vida, como o autor. O traçar dos fatos desde a infância, lembrando os necessários corretivos da mãe de origem alemã. O menino arteiro, que se tornou um homem íntegro, graças à bondade do pai e aos corretivos de Dona Violeta. Dos encontros e desencontros do amor que se fez presente e se dissipou na distância e no tempo, sem rancores, temores ou angústias, deixando na vida o sabor da alegria dos tempos idos. O autor transporta experiências vivenciadas, com a imaginação fértil de um bom literata, discorrendo com facilidade sua intelectualidade, ao tempo em que demonstra seu gosto popular, permeando os contos com aspectos cômicos dos fatos da vida. Consegue dramatizar numa quadra de vôlei, quando o velho levanta-se num ímpeto, buscando a atenção da pretensa amada, e é traído pela natureza que o surpreende com a flatulência estrondosa, jogando ao chão seus últimos suspiros de homem. E demonstra que o ser humano racional, é capaz de calar a voz da vingança, rompante momentâneo que leva tantos à própria derrota, às prisões e a distúrbios sociais desnecessários. A verve do poeta transparece nos verbos do autor, que conjuminados transformam-se em belas poesias e prosas. Recomendo a leitura deste livro da lavra do poeta, intelectual, magistrado e ser humano magistral, Rui Guilherme.
Gilvam Borges é senador da República pelo Amapá
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