Livrai-nos do Katrina
O Grupo dos 20 apareceu na crise da Ásia do final dos anos 90, quando Malásia, Coréia, Tailândia, Hong-Kong e Japão entraram numa crise de liquidez e mergulharam numa recessão. Tivemos, também, as crises da Rússia, da Argentina, Brasil e outros países, onde quase fomos ao default. Com a globalização, nada deixou de ser global, principalmente a área financeira.Agora as teorias da liberdade total, nenhuma regulamentação, desapareceram na fumaça, assim como as teorias marxistas da estatização dos meios de produção. Outra coisa que desapareceu foi a crença na solução mágica da redução dos déficits. Stiglitz sintetizou essa derrocada assim: "Levamos longe demais a regulamentação e a redução do déficit, sem defender tão vigorosamente quanto deveríamos as importantes funções que o governo pode e deveria desempenhar". Não vamos tão longe quanto desejar que aconteça o que Paul Krugman diz que salvou o New Deal e a economia americana: o gigantesco estímulo fiscal (leia-se déficit) da Segunda Guerra Mundial.A reunião do G-20 mostrou-nos a total balbúrdia teórica e prática em que estão mergulhados os responsáveis pela economia mundial. Este G-20 – há outro, dos países em desenvolvimento – é composto de 20 países, entre ricos e emergentes, que concentram 90% do PIB mundial, 80% do comércio e dois terços da população. Pois essa poderosa cúpula mostrou que não sabe por onde ir ou ao menos começar. O New York Times foi o primeiro que no alto de sua autoridade a classificou de reunião retórica. Antigamente este vício de falar sem dizer nada era considerado latino-americano. Agora se vê que é mundial. Ninguém guarda a língua, nem mesmo para falar javanês.O mais importante que decidiram foi nova reunião no dia 30 de abril! Até lá vamos rolando de ladeira abaixo.O doutor Henrique Meireles contestou as versões de que todos estavam de acordo mesmo sobre pequenos assuntos. Um deles era de reduzir gastos, apertar cintos e emagrecer. O presidente do Banco Central do Brasil, servindo de intérprete, leu o texto em inglês para mostrar que não sabia onde estava esta recomendação e disse que eram interpretações metafóricas.O Brasil ganhou com a reunião, mas foi um realce de que realmente seu status internacional melhorou e agora tem uma cadeira onde sentar nestas reuniões e não ficar em pé, ou atrás dos delegados junto aos assessores.No mais é saber que estamos mais bem preparados para enfrentar crises, mas depende do tamanho delas. O certo, certo mesmo, é que teremos alguns anos pela frente morando no Golfo do México em época dos furacões. Peçamos a Deus que não tenhamos que enfrentar o Katrina.
José Sarney é ex-presidente da República, senador do Amapá e acadêmico da Academia Brasileira de Letras e da Academia das Ciências de Lisboa
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