sábado, 13 de dezembro de 2008

Um governador das Arábias


Visitei Chicago quando presidente da República para apoiar uma equipe de físicos brasileiros que participavam da busca do quark, a partícula fundamental do universo. Sempre tive uma curiosidade grande pela física pura, e o mundo das partículas me fascina, nesse intrincado jogo que não entendemos muito, dos elétrons, prótons, bósons e outros mistérios mais. Em Chicago, no Fermilab, desenvolveu-se a desintegração do átomo. Os títulos de Chicago são muitos: terra de Al Capone, o mais conhecido gângster americano, Máquina de Chicago, para caracterizar a política mais corrupta dos Estados e termo pejorativo para qualquer um que fosse acusado de pertencer a ela, e, nos últimos tempos, Escola de Chicago, em que pontificava o grande economista Friedman, oráculo de Reagan e pai do liberalismo mais radical, ídolo dos neoliberais. Illinois é um dos maiores e mais ricos Estados dos EUA, e um dos centros científicos e econômicos do mundo. Chicago é sua maior cidade, e a capital, Springfield (onde numa noite de 1964 comi um milho na manteiga, numa feira rural), é uma cidade pequena e bem típica do interior americano. Terra de Lincoln, que também foi senador por Illinois, o grande estadista que conduziu a Guerra da Secessão, emancipou os escravos e morreu assassinado num teatro de Washington. Dois senadores negros foram eleitos por Illinois: Obama e Carol Moseley Braun. Pois não é que volta a ser, também, o Estado mais corrupto dos Estados Unidos, onde a política é feita na base do crime e das barganhas. O governador atual Rod Blagojevich, já reeleito, numa campanha dura contra corrupção, sucedeu ao governador George Ryan, que até hoje está preso por ter feito das boas durante o seu mandato. Pois o moralizador, considerado pelos líderes de ambos os partidos o pior de todos os que eles já viram, agora foi agarrado negociando, num leilão de cinco licitantes, nada menos que o lugar do presidente eleito, Barack Obama, que, pela lei americana, lhe cabe indicar. Essa história de indicar senador sempre deu o que falar nos EUA. Um governador do Alasca indicou a filha, um da Louisiana, a mulher, e, atualmente, o lugar do vice, Biden, está sendo preparado para o seu filho. O diabo é que isso é motivo de constrangimento não só para os políticos americanos mas para todos nós, que verificamos nesse exemplo o quanto ainda a democracia e homem têm que caminhar para o terreno dos bons costumes, E o palavreado do governador não é dos mais contidos: "Quero dinheiro e não vou dar esse lugar a esse fdp (o presidente Barack Obama) de graça por nada. Ele que sifu...". Aqui e lá, más falas há...

*José Sarney é ex-presidente, senador do Amapá e acadêmico da Academia Brasileira de Letras e da Academia das Ciências de Lisboa

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